As pessoas , copiosamente, fazem uso da palavra amor para identificar sentimentos egoístas de posse e dever para com a outra parte. Amar não significa abdicar de você para ser exclusivamente o outro ; ser o que este gosta ou que deseja que você seja... Não significa ter na “fidelidade” as “rédeas” do sentimento verdadeiro e duradouro . Antes de tudo, é preciso saber que ser fiel é amar da forma mais fiel ao amor. Mas o que é o amor? Faz-se mister saber qual é o valor que esta palavra possui em nossa vida, para que possamos entender o que é ser fiel , ou mesmo o que é fidelidade.
O amor é, antes de tudo, livre por concepção : não aceita ordens, não segue caminhos previstos, não é racional, não se molda a estereótipos, não possui um “manual”. Quem ama, cuida – concordo - , mas isso não significa ter a uma pessoa o mesmo apreço que se tem por um bem material . Imagine que um belo dia você ganhe uma rosa e que esta , ao seu coração , tenha uma importância incalculável. Então você se vê dominado por uma vontade voraz de preservar a rosa intacta , de escondê-la de tudo e de todos :ela é sua e só continuará sendo sua enquanto estiver sob seu domínio , enquanto ninguém a ver ou tocá-la ( nem mesmo o tempo).Para que isso aconteça, você a coloca numa redoma de vidro, sobre uma mesa, num quarto completamente fechado (do qual apenas você tenha a chave).
E , assim, verá sua estimada rosa escapar por entre seus dedos.
O amor não se dá aos que o querem por imposição, mas sim aos que o conquistam. Além de se dar , o amor concede a estes o laço da necessidade e não o nó da dependência . O amor só continuará sendo amor pela fidelidade ao sentimento compartilhado , ao sentimento recíproco e à lembrança natural e reconhecida desse sentimento.
A fidelidade não existe como um valor único e independente, ela está implícita no amor sincero e recíproco. Quando se ama e se é amado em intensidades relativamente iguais , a precisão do ser amado ( sua metade) torna-se uma “dependência” inconsciente e saudável. Quando rompemos este laço em busca de algo que nos falta , estamos demonstrando (exteriorizando) que o outro- por si só- não nos completa; estamos confessando a nós mesmos que não há amor, mas sim apenas uma coleção de sentimentos e afinidades para com o outro ,e que este não nos basta, não nos completa. Isso não é infidelidade, mas sim inexistência de amor.
O ciúme é uma forma de coerção, o amor é liberdade. Vejo a fidelidade – neste caso – como um dever (devo fidelidade à pessoa que amo). Quando existe amor, não existem deveres: seria como obrigar uma criança a comer chocolate ou a tomar sorvete.
Por fim , vejamos o amor não com os olhos de Otelo, mas sim com os de Romeu : súbito vazio dentro da lógica de Eros , pois se o amor é desejo e o desejo é carência , só podemos amar o que não temos, e sofrer com essa carência. Mas aí já é outra estação...