Estou aqui em casa ouvindo Dizzy Gillespie’s Cool World, enquanto espero minha mulher que foi visitar umas amigas num chá de fralda....
Eu não vou, nem pensar, ainda quero viver bastante, e acho que aquela atmosfera me atacaria os pulmões, secando-os até o último catarro. Não gosto de ficar sem catarro, posso querer mais tarde, cuspir em alguém.
Jamais iria numa reunião destas, que é pra não acostumar mal meus camaradas.
Não gosto de comprar amizades, pois, quando alguém me convida pra ir numa festa, onde está expressamente implícito que terei de levar presente, eu não vou, não quero nem estar presente. Não quero ser murrinha, nem avarento, mas simplesmente, não gosto dessa imposição de afeto, pois se tiver de presentear um amigo, que seja um amigo mesmo, e que eu o faça com gosto, e não por imposição de um costume festivo, que aliás, não vejo nada de festivo nisso.
Deixe, estar, estou melhor aqui, na companhia do Dizzy, e sua trompa desvairada.
È bom, num Domingo depois do almoço, ficar a toa, sem compromissos, nem vida social alguma. Só eu e o Dizzy... Poderia bem estar escrevendo nu com a minha letra, mas estou de pijamas ouvindo Dizzy. Poderia muito bem estar navegando pela Internet, pelos sites adultos, gastando meu cartão de crédito, minha conta telefônica, e mesmo minha energia elétrica... aliás, é isso mesmo que estou fazendo. Como adivinharam?
O Dizzy vai executando malabarismos sonoros e bucais, mas também tem um pianista muito bom e velozmente ágil, da bateria ouço apenas o tilintar dos pratos, enquanto uma ou outra batida na caixa, bumbo, tom-tom e surdo. O baixo marcando o compasso, e a guitarra quase imperceptível - já ouvi dizer que com certos guitarristas de jazz, somente faziam falta, quando não estavam em palco. O tema voltou outra vez, com vários metais entoando em uníssono a melodia, repetido exaustivamente, e depois mais uma vez pra terminar. Agora o Gran-finale, onde todos os músicos entoam as notas mais altas que puderem, Dizzy é insuperável, ele alcança o patamar mais alto de todos, pois, enquanto todos achavam impossível subir mais uma escala, o Dizzy sobe mais umas três.
Deixa o Dizzy tocar, esse chá acabar, minha esposa voltar, e enquanto isso, aconselho vocês a colocar um disco de jazz na vitrolinha – daqueles com um trompetista na capa – e curtir um sonzinho no aconchego de casa. Antes que inicie o tema de abertura do fantástico, e você lembre que amanhã é Segunda-feira, dia útil, e você pega cedo no batente. Pois, mesmo sem querer, eu instaurei na sua mente a certeza de que você não fez nada do que queria pra esse Domingo e ainda não deu nem tempo de ouvir um sonzinho pra valer, então assim é que tá bom. Domingo é mesmo um dia inútil, não é?
Eu acho, e pronto...
Agora me lembrei de todas as contas que tenho pra pagar... Daqui a pouco o fantástico começa, e logo depois vem o sai de baixo, e por mais que você esqueça a TV desligada, tem sempre um vizinho surdo o suficiente pra deixar o volume nas alturas, como o próprio Dizzy Gillespie, e seu Cool World.