Uma de minhas diversões mais saudáveis é “imaginar”.
Menina ainda, a veia poética dominou-me. Mas não foi por mero acaso.
Eu tinha uma forte relação com meu avô materno, João Luís, que me incentivou a declamar poesias.
Lembro-me que, por ser ainda imatura quanto à compreensão das palavras, recitava constantemente alguns cantos de Os Lusíadas e me fazia repeti-los... Eu, toda faceira, ia entoando seus cantos:
“Ar armas e os barões assinalados... Taprobana?” O que isso significava?
Vovô explicava que era um lugar. E eu pensava: “Taprobana deve ser bacana!”
Mais tarde, devorei os sonetos. E o “fogo que ardia em Camões” alastrou-me o interesse pelo poeta lusitano e pela literatura.
Vovô nem chegou a saber, pois já havia partido para o além... No meu exame de vestibular caiu-me nas mãos um fragmento tortuoso do Episódio de Inês de Castro - Canto III, onde a dura tarefa era dividir e classificar todas as orações ali contidas.
Quem foi de minha época sabe muito bem... Querer apavorar um estudante bastava dar-lhe com Os Lusíadas nos olhos!
Mas, não só as declamações da infância, como o apuro da linguagem que o mavioso avô me incutira, apesar de pouco letrado, foram decisivos naquele vestibular...
E com uma saudade grata veio-me à lembrança o vislumbre de uma silhueta afável e bela daquele que, ainda forte, partiu tão cedo para o Sossego dos Anjos...