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Artigos-->Academia – do Fardão e da Confusão -- 22/12/1999 - 11:17 (Amargedom) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Cortejada pelo governo. Protegida pelo Estado. A Academia Brasileira de Letras, com seus 102 anos de existência, é uma instituição conservadora, elitista e aristocrática. Esta é a visão do escritor e crítico Fernando Jorge em seu livro A Academia – do Fardão e da Confusão








Polemista mordaz, Fernando Jorge faz uma leitura demolidora da Casa de Machado de Assis. Desenvolve um estilo impiedoso contra os velhinhos do Petit Trianon. Dessacraliza os imortais da ABL, chamando-os de mesquinhos, vaidosos, confusos, medíocres e contraditórios, sem esquecer de destacar as devidas exceções: Machado de Assis, Guimarães Rosa, Viana Moog, João Cabral de Melo Neto, João Ubaldo Ribeiro, Antônio Houaiss, Antônio Callado, entre outros.


O livro, publicado pela Geração Editorial, dirigida por Luiz Fernando Emediato, tem causado polêmica e promete ser um dos campeões de vendagens. Emediato opina: “É com o espírito de João Ubaldo que se deve ler este livro – mesmo quando não concordamos com seus termos. A franqueza rude e passional do autor só pode chocar aos fariseus e aos hipócritas. Jamais aos que têm compromisso com a verdade”.


Fernando Jorge faz uma análise crítica, irônica, sarcástica, às vezes exacerbada da Academia Brasileira de Letras e de seus pretensos imortais. O autor usa termos variados para ridicularizar o famoso grêmio literário: “Subserviente, estéril, decadente, covarde, confuso e grotesco”.


Um dos exemplos do grotesco citado pelo autor no livro é o tom fantástico e sobrenatural dado ao enterro do ex-senador e antropólogo Darcy Ribeiro. A ABL enterrou o corpo de Darcy Ribeiro no jazigo 27, em de seus mausoléus, no cemitério São João Batista, no mesmo túmulo em que abrigava os restos mortais do acadêmico e jornalista Elmano Cardim. No Dia de Finados, a família do jornalista foi visitar o túmulo e, lá, descobriu que por ordem da ABL, o esqueleto tinha sido substituído pelo ilustre cadáver do senador. O filho do jornalista, Elmano Gomes Cardim Filho, escreveu uma carta à presidente da academia, Nélida Pinõn. Como não recebeu nenhuma resposta de Nélida, Elmano Júnior entrou na justiça e ganhou a causa. Os corpos foram trocados e a família Cardim ainda recebeu a indenização de R$ 13 mil.


Outro caso interessante relaciona-se ao historiador Hélio Silva que, segundo conta o livro, gostava de plagiar. O acadêmico Alberto Venâncio Filho fez uma grave denúncia sobre plágio de Hélio Silva em verbete de sua autoria. O acadêmico plagiado denunciou o fato durante uma homenagem prestada ao falecido Hélio Silva: “Vamos saudar os que partiram, mas este plágio a morte não absolve”.


A ABL foi palco de diversas disputas, principalmente nos últimos dez anos. Na disputa pelo prêmio José Ermírio de Morais, no valor de R$ 50 mil, digladiaram-se Roberto Campos, com um livro de memórias; e Fernando de Morais, com o livro Chatô, o rei do Brasil. Houve, na ocasião, uma nítida divisão entre conservadores e esquerdistas. Roberto Campos foi defendido fervorosamente por Roberto Marinho e pela ex-trotskista Raquel de Queiroz. Os dois faziam parte da equipe de seleção do prêmio. Fato curioso: “Na obra de Fernando de Morais, o presidente das Organizações Globo aparece como beneficiário de uma decisão do então general Castelo Branco, que pôs uma pá de cal no já decadente império de Chateaubriand e abriu caminho para o reinado do dono do conglomerado Globo. Essas são algumas histórias contadas no livro de Fernando Jorge. Uma leitura extremamente útil para se entender o lado oculto de uma entidade centenária como a ABL, com suas mazelas e contradições.


Em outras palavras, Fernando Jorge passa o recado de que uma academia de letras deve lutar permanentemente pela preservação das letras e do patrimônio cultural, fato que quase não se vê na ABL. Ao contrário, enquanto o país passa por momentos de grandes dificuldades econômicas, políticas e religiosas, os intelectuais e formadores de opinião deixam-se levar pelas fogueiras das vaidades e do egoísmo e esquecem de lutar pelas transformações sociais. Principalmente agora em que o Brasil vive um momento de afirmação às vésperas de seus 500 anos de colonização e de um novo milênio. Cadê a ABL que não faz sequer uma campanha pela alfabetização de tantos brasileiros que vivem na escuridão?


O livro A Academia – do Fardão e da Confusão deve ser lido nas escolas para que os alunos passem a desenvolver o espírito crítico e analítico tão necessários no mundo de hoje onde impera a letargia do consumismo e a mediocridade impostos, na maioria das vezes, pela mídia eletrônica com seus programas de imbecilização que formam exércitos de estúpidos omissos e alienados. Parabéns a Fernando Jorge pelo trabalho árduo da pesquisa que mostra o lado cruel da desinformação. Que após tão severas críticas, a ABL e outras entidades culturais possam acordar para uma nova era cultural, onde sejam valorizados a liberdade de pensamento, a criatividade, a arte que liberta o homem.





Gustavo Dourado
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