Administro as urgências da vida sem pressa, com preguiça, sem ganas, sem maiores expectativas. Enfim...o que sei eu de urgência? Talvez possa hoje falar somente da que vejo com relação à carência dos idosos: a de poder falar livremente.
Quem os ouviria? A quem se reportariam ? Quase todos são calados... Salvo um ou outro desavisado, ou com reduzida percepção.
Os filhos são os grandes responsáveis por essa mudez. O “cale a boca” filial muitas vezes não é transmitido pelo dito escancarado, mas por gestos duros, ou por olhos que ameaçam velada ou abertamente.
O idoso queda-se discreto e medroso, antes de proferir uma opinião, uma consideração, antes da tentativa de um relato de memórias.
Seu olhar derrama lampejos de indecisão, raios de medo, pedidos de licença. É desolador constatar que sua vivência e certeza são tão pouco valorizadas e aproveitadas.
Quando o indivíduo torna-se detentor do conhecimento que o tempo lhe conferiu, menos ouvido e acreditado será.
Depois de sua partida, certamente haverá a corrida aos seus guardados onde um rabisco, um escrito inda possam resgatar uma nesga de sabedoria, um caminho já experimentado.
É a esperança última de encontrar a sobra da palavra reprimida pela mordaça, que soberana imperou.
Aí, de nada adiantará a urgência. Perdeu-se a oportunidade do treino da cumplicidade, do carinho, da adição.
Aí, lágrima nenhuma dará jeito, tampouco livrará o peito da dor do arrependimento e do desperdício do tempo da aprendizagem através da linguagem do amor.
Os idosos não se calam por opção, nem pela própria velhice, são calados pela impaciência daqueles a quem, um dia, eles mesmos ensinaram a falar.
Nota:
Ontem, no supermercado, deparei-me com a filha a gritar com a mãe idosa.