ffffff>Eu e a Poesia, pouco a pouco, fomos ficando indissociáveis, quem sabe, se como tantos e tantos outros, perenemente, até ter alcançado, por volta dos meus 30 anos, a fusão que cada vez mais sinto expandir-se. Cômo, bebo, sexualizo, durmo com ela. Integrei-a por completo em todos os gênes, desde que imperceptivelmente a recebi de João de Deus e de Guerra Junqueiro. Com ela vivo e morro, dando-nos em sólido amplexo a cantar de corpo e alma. Trago-a por isso inevitavelmente à flor da pele e exponho-a sem reservas.
O poeta, quanto a mim, é mais um estado de ser para agir, do que, propriamente, um indivíduo que escreve versos, embora seja por eles que é uso e costume avaliá-lo ou reconhecê-lo. Então não existiram tantos poetas que não escreveram sequer um verso?!... O condão de intensificar pensamentos e ideias nem a todos é dado, mas é bem na acção da sua existência que o poeta se traduz e consagra autenticamente.
Um só exemplo: um jardineiro, daqueles que outrora não sabiam ler nem escrever, apresentava um jardim que, num ápice ao olhar, era um imediato poema que levava uma vida inteira a ler. Tal como se refere um jardineiro, evoque-se um pedreiro...
Assim, na alegria ou na tristeza, procuro ser feliz apenas por mim mesmo, nunca me subordinando à felicidade propalada. Quantas dolorosas sensações deveras experimentei partindo do princípio com que tanto sonhava e acalentava? É pois adentro deste paradoxal conceito, onde inexoravelmente todos caem, que o culto do poeta mais me serve para a vida e me faz destemer a morte, essa coroa de imortalidade ou definitivo esquecimento.
Anda cá palavrinha endiabrada
Menino-menina de alma estouvada
Sob a asa-maravilha da inocência:
Amor... Amor... Expressão carregada
Pelo tempo fora de alma abnegada
A fugir do corpo... Abjecta indecência !...
Interrogação: Você acha que o corpo é divino?!...
António Torre da Guia
O Lusineiro |