Há momentos na vida que precisamos remexer os nossos guardados para nos atualizarmos com o que é necessário manter e o que não significa mais nada para nossa vida.
Às vezes, essas horas, que nos parecem perda de tempo, nada mais são que as nossas avaliações de nós mesmos, se mudamos ou continuamos a ser a mesma pessoa, parada, presa ao passado.
Assim olhamos sob outro ângulo, com o olhar do conhecimento que o tempo nos favoreceu adquirir.
E vem aquela pergunta: “ Por que guardamos coisas? O que nos faz sentir apego a algo que só nos traz lembranças? Mesmo que seja boa, lugar de lembrança é em nossa mente, guardada com carinho, aquela que nos traga um sorriso, um suspiro, talvez...”
Mas, difícil você achar que uma casa não tenha armários entulhados ( e essa palavra já diz tudo!), coisas que não se usa nem usará mais. Uma roupa quase nova, camisas, gravatas, sapatos. Sempre costumamos repetir: “As coisas boas não se pode jogar fora!” De fato não devemos. Mas algum lugar existirá onde alguém poderá se servir delas. Há roupas e... roupas. Umas são úteis, outras só para festas. Um brechó paga muito pouco, praticamente nada. Mas alguém pagará pouco também para dar-lhe utilidade novamente. E que nos importará isso senão o fato de saber que ela é útil e tem quem a aprecie?! Pelo menos estaremos fazendo alguma caridade, nem que seja por nós mesmos.
Mas, não apenas roupas e sapatos guardamos. Há objetos que se tornaram de estimação, um relógio antigo de um avô, abotoaduras, coisas do gênero. Talvez mesmo uma máquina fotográfica das bem antigas. Coisas como estas não são velharias, são preciosidades antigas, nem ocupam tanto espaço assim. Não compõem uma coleção, mas merecem ser guardadas, são relíquias que contam uma história. São objetos como estes que merecem uma vitrine, eles pertencem ao tempo, a uma época e não propriamente a uma pessoa.
Mas, sempre haverá alguém que tenha entre seus guardados, lembranças de um pai ou um avô, um baú com botas especiais, com perneiras de lona grossa cheias de fivelas, próprias para o mato, capas azul-marinho forradas de vermelho, dessas para andar a cavalo em tempo frio ou de chuva, objetos próprios para caçadas, facões de formas diversas com cabos encrustados de pequenas peças de metal ou lavrados em madeira, bainhas de couro trabalhado, verdadeiras preciosidades juntamente com outros objetos feitos de madeira chamados de “pios”. Estes são especiais para atrair diversos pássaros. Não sabemos se hoje ainda existem dessas coisas para vender. Só sabemos que ali naquelas vestes está o antigo dono que saía pelos matos de uma fazenda procurando algum animal desgarrado, outras vezes ia mais longe caçar uma ave silvestre, como era do costume naquela época, uns sessenta, setenta anos ou mais, quem saberá?
Cenas como estas estão impressas em fotografias amareladas que também estarão guardadas em uma gaveta de saudades.
As cenas de caçadas foram exibidas por séculos em gravuras ou tapeçarias. Muitos foram os “gobelins” enquadrados, colocados sobre um sofá mostrando cenas inglesas ou francesas de caçada, com homens e mulheres vestidos à caráter com a indumentária vermelha, seu boné, seguindo cães farejadores atrás de uma raposa, atravessando campos e florestas. Era o esporte da época entre os senhores abastados.
Hoje, tais cenas trazem-nos uma certa melancolia. Nossa concepção sobre caçada mudou. Não vemos mais beleza em tal cena, mas um certo sentimento de tristeza ao ver como o homem se comprazia em fazer um momento de descontração, festejando a oportunidade de aniquilar um animal por prazer.
Lembranças como essas fazem-nos pensar nas touradas.
Ainda temos as touradas, cujos filmes deixavam-nos com o coração apertado sofrendo com os riscos que corria o galante e festejado toureiro. Lamentamos atualmente, tal esporte. Usar um animal de raça, arriscando a própria vida pela glória de dobrar a sua força, humilhá-lo, cansá-lo naquele vai-vem de uma arena, perante um público ávido por sangue.
Não podemos compreender como, em pleno terceiro milênio a criatura humana ainda se compraza com violência bestial, como estas, incluindo uma luta de boxe, um dos mais rentáveis esportes.