O Fado levou-me pela primeira vez à Casa da Música, estranho edifício com algo de lunático e quiçá visionariamente destinado a estabelecer os iniciais contactos sonoros com os marcianos, quando estes enfim se decidam visitar a Terra.
Para fruir a tradicional noitada fadista, suei às estopinhas, fartei-me de andar de um lado para o outro, indagando naquele betonante deserto onde se comprava bilhete - 5 euros - e se tomava lugar na sala Suggia, ao cabo de bater três vezes com a cabeça nas vidraças e subir centenas de degraus sem saber onde meter os pés.
Com a glorificada Diva no panteão da alma, tive ensejo, mais uma vez, de verificar como se braga o Fado, como se lhe atropela a tradição, destrói a essência e como "tudo isto é triste...".
Estoicamente tenazes na função, restam as cassetes dos famosos fadistas, os perfumes poéticos dos vates de outrora e os derradeiros intérpretes do Fado tal como é: sobre o tablado, Nuno de Aguiar, Artur Batalha, Luísa Soares e, sentado na plateia, Fernando Gomes. Resta ainda o débil milagre do renascimento: Rute Rita, a juvenil ganhante da noite entre os mestres do facilitismo conveniente. De facto e sem óbice, numa época existencial assaz à deriva, "tudo isto é Fado". |