Ao entrar num avião da “VASP” em junho de 1999 em Cumbica, com destino ao nordeste, vi um parafuso da porta quase solto. Com a unha do polegar direito um pouco crescida, a qual uso para manipular peças de relógios, posto que sou relojoeiro, tentei apertar o tal parafuso ao perceber a fenda grande. Sem querer, acabei por causar uma discussão com a aeromoça, a qual me repreendeu pelo ato que para ela devia ser obsceno demais. Ora, um parafuso da porta de avião quase solto para um passageiro devia, no meu ponto de vista, ser um caso de polícia. Mas, não era. As pessoas entravam, sorriam, relaxavam e gozavam como se isto fosse a coisa mais normal do mundo. Acabei passando por um pateta qualquer. Anos depois a empresa mostrou a cara e entrou em colapso. Não me orgulho de dizer que estava certo. Ainda mais quando no meio da viagem o avião começou a bater as asas igual a um urubu alçando vôo. O piloto avisou para colocarmos o cinto de segurança porque haveria turbulência causada por um vento muito forte. E isto a mais de sete mil metros de altura. Bom, nestas alturas a gente já estava mais pra lá do que pra cá com vários uísques na cabeça. Mas, vi muitas senhoras rezando o terço. O horrível tremor demorou quinze minutos.
Contudo, a gravidade do setor aéreo no Brasil parece ter aumentado. Se vamos tão bem na economia por que temos uma estrutura aérea das mais capengas do mundo? Aposto que o nosso herói João Ribeiro de Barros deve estar muito triste com tantos desmandos no setor aéreo brasileiro, ele que se esforçou por dar a este país uma marca inolvidável de capacidade e esforço sobre-humano. Mas, está assim em razão da incapacidade de nossas autoridades eletivas que não sabem distinguir alhos de bugalhos. O poder deixou há muito de ser democrático-progressista. As ditaduras calejaram a estrutura republicana. Deram mais poder ao poder constituído em detrimento do homem trabalhador, que vegeta, dá o sangue e a própria vida para a felicidade do capitalismo selvagem. Os controladores de vôo são assim como os cortadores de cana, respeitando-se a enorme disparidade entre eles. Se os controladores de vôo não podem fazer greves porque são militares, ficam escravizados a um sistema que os pune vergonhosamente. Nem sequer podem ter seus salários aumentados de acordo com os colegas civis. Dão eles toda a estrutura para os ricaços, ou os endinheirados da vida viajarem no regaço de uma poltrona de avião com toda segurança possível em troca de um salário miserável. Não podem reivindicar, nem rogar por melhorias no serviço, nem reclamar dos aparelhos que estão superados pelo tempo porque são funcionários escravizados às máquinas de controle espacial. Aí vem o presidente desta República e diz: “eles são uns irresponsáveis”. Um militar de alta patente disse: “isto é um motim, eles não passam de amotinados”. Talvez, os irresponsáveis e amotinados deste país são nossos governantes, os quais nunca fazem algo de bom para todos nós que os sustentamos. Se o nosso ministro da Defesa, o Sr. Waldir Pires não consegue resolver o problema de forma a atender todos os reclamos, tanto dos passageiros quanto dos controladores de vôo, então podemos concluir que estamos vulneráveis, isto é, sem defesa nenhuma. Pela idade dele seria de bom alvitre aposentar e desaparecer da vida pública.
Deve sempre existir o bom senso e a responsabilidade de se fazer reivindicações, respeitando-se determinados setores essenciais para o funcionamento do país. Mas, no caso dos controladores de vôo se houvesse também o bom senso das autoridades maiores as reivindicações deles seriam atendidas. Contudo, essas autoridades fazem fumaça, mas não fazem fogo. No auge do poder aconselham a “relaxar e gozar”. Ora, quem viaja em aviões privativos com exclusividade pode chegar a esse extremo. Porém, quem espera horas para pegar um avião, que pode colidir com outro, está mais para um desequilíbrio emocional pensando neste tremendo azar.
(publicado no jornal "Comércio do Jahu" de 19 de junho de 2007 - página 2 - Opinião)