É soer dizer-se: «Isso, é muita areia para a minha camioneta» e logo adiante, assim que tudo está entendido aquém e além das palavras todas, surge o conformado e saudável desabafo «é a vida!», eloquente súmula da existência humana.
Há cem anos, dia 1 do mês em que alguns só aniversariam de quatro em quatro translações, a carruagem real transitava no Terreiro do Paço. No seu interior acomodavam-se o rei, Dom Carlos, a rainha, Dona Amélia, e os dois filhos, Luís Filipe, herdeiro do trono, e Manuel, o rei-sem-saber que o destino designou em breves segundos.
Repentinamente um vulto barbudo embuçado afronta o trote dos equinos, estende a arma à posição de tiro e baleia o pescoço do rei. A fuzilaria lateral fez o resto, o resto que não fez tudo, já que Dona Amélia e Dom Manuel escaparam ilesos graças ao confuso ápice que se gerou.
A História, em lugar de expurgá-los da existência da memória, regista os «valentes heróis», os que almejam o trono da vida exercitando a morte, entre outros, os regicidas Manuel Buíça e Alfredo Costa.
Ainda mais do resto, ao cabo de quase 33 meses de peripécias do arco-da-velha que aspira no espelho a juventude, a República que hoje se vive, foi proclamada a 5 de Outubro de 1910, centenário que está mesmo ali adiante à esquina do tempo a espreitar.
Nesse dia, se ainda por cá estiver, quiçá me comova a aplaudir Cavaco Silva e José Sócrates, o tandem anti-suicídio no meio dos alorpantes suicídios todos que não têm cessado de ocorrer.