Depois que as coisas passaram, a visão clareou e passei a enxergar nitidamente. Tudo!
Quantas e tantas vezes... Deixei de lado coisas importantes que tinha a fazer, para penetrar neste mundo, fantasioso, que enganosamente nos prende, num delírio inconseqüente, e bloqueia-nos a razão.
Que precioso "tempo perdido"...
Às vezes, madrugada adentro, perdia-me em devaneios, a comungar experiências, trocar confidências... Para depois me encontrar na névoa das estrelas que pela janela adentravam.
O dia amanhecia e me surpreendia com o canto dos pardais que pleiteavam as sementeiras do jardim.
E eu, na razão de meu tempo "real" recriminava-me: “Meu Deus... Tanto a fazer...” E a amargura não me recuperava a insensatez diante do dever...
Mas... Partiste... Deixando um vazio impreenchível.
Quis enganar-me que foste apenas um produto de minha imaginação. Mas tuas palavras ali estavam: doces, repletas de significados a transformar em carícias... União de letras, palavras, parágrafos ou versos, a brincar no papel, a saltar... E dali saíam para minha mente a transformar-se em melodias que invadiam todo o meu mundo e transformavam em sorrisos frenéticos as minhas tristezas de rotina.
Partiste.
E eu senti.
Partiste.
E eu agradeço.
Pois assenhorei-me, agora, de meus dias, de meu tempo real... E percebi como isso é importante. Quase vital, para a relação constante e o dever que temos com os compromissos que nos fazem SER.
Mundo que, talvez não seja o que desejamos.Mas é o de que dispomos e devemos ficar agradecidos por existir.
É na atuação deste mundo que nos tornamos "presentes" e a cada momento podemos "agir" e mudar alguma coisa. Afagar pessoas, tocá-las. Aquele aperto de mãos, caloroso, onde a pulsação do sangue se faz sentir. Aqueles olhares profundos que nos deixam cativos, e felizes por ver rostos rosados, barbas por fazer, pernas que se cruzam, displicentes... Calda de caramelo a cair pelo canto da boca, uma folha seca no cabelo, sorrisos, lágrimas que se alternam em festas ou sentimentos. Não ter o que fazer no fim da tarde e sentar para um bate-papo, um refresco... O descompromisso de domingo...
"Que tal um carvãozinho, um pedaço de picanha e uma farofa? Sorvete de sobremesa... Ficaremos em casa, hoje? Oba! Que legal! À noite iremos ver o bebê da Flávia que nasceu, a cadela do Thiago que deu cria, o Bingo da Praça, regado a cerveja e com danças malucas... Podemos ir? Claro!”.
Essa é a vida. Resgate de um sonho ao alcance das mãos. Pra que mais?