Quando eu tiver sessenta e quatro, devo insistir que me deixem quieto, sem preocupação alguma. Tirem-me do volante de qualquer carro, mesmo que eu insista, dizendo ainda ser apto a dirigir. Quando a idade chegar e o cabelo cair, devo estar perdendo a noção de estrada e posso muito bem estar mentindo quanto aos graus de visão que já não mais tiver. Teria apenas o conforto de saber que em algum ponto de minha vida fora um bom motorista. Continuarei a receber cumprimentos entusiasmados, como quem ainda tem a vida inteira pela frente?
Terei trocado minha recém adquirida sabedoria, por uma mais ultrapassada, que para mim continuará sendo a mesma nova tecnologia que aprendi neste muitos anos atrás que virão. Mas se fossem nos dias de hoje, teria pavor dos modernos micro-sistemas com suas fitas magnéticas, discos compactos, e seria mais apto a utilizar os velhos gravadores de rolo nos amplificadores valvulados. Saberia mais sobre a vida que qualquer jovem internáutico, e freqüentemente seria visto nas velhas filas de banco, pois teria uma forte incompatibilidade com os novos caixas eletrônicos, jamais confiando nos japoneses por trás das máquinas.
Serei velho e antiquado, porém com muitos anos nas costas, um antiquário de idéias, numa velhice pacata e tranqüila. Saberei contar em detalhes sobre os anos noventa, pros filhos dos filhos dos meus filhos, e minhas estórias serão recebidas com alegria e entusiasmos. Terei vivido entre o limbo de dois milênios, e jamais farei viagens de turismo no espaço, patrocinadas pela Nasa. Jamais terei a noção exata dos poderes da informática e seus componentes. Serei uma relíquia viva de uma época mal vivida, e digo isso em face de que os anos melhores virão. Frente a isso, serei sempre saudosista.
Farei tudo com muito mais cautela, e guardarei uma sensação de que deveria ter nascido velho e idoso, pra terminar meus dias de volta à barriga de minha mãe.