Acordei, lamentavelmente, hoje com o barulho de uma motosserra.
Lá se foi uma e agora outra árvore cortada. Outra casuarina inocente ao chão.
A desculpa mais atual está agora nas raízes da árvore. Como já esteve em folhas que caem e forram o chão da rua, na sombra das árvores tampando o sol das casas.
O que é cortado numa Lua minguante, como hoje, não renasce, não reaviva jamais.
Um aviso para economizar água está, de novo, na entrada, logo na portaria.
Quando viemos para o Retiro das Pedras na década de oitenta, tantos estavam à procura de silêncio, verde, ar puro, canto de passarinhos, do pôr-de sol...e do maravihoso sussurar das casuarinas em noites de vento ou de chuva, imitando o mar. O mar que mineiros não temos. O corte de qualquer árvore seria imediatamente impedido pela administração. Era preciso autorização do Instuto Estadual de Florestas; o abate de árvores era passível de punição e multa. Os obstáculos eram muitos e a maioria desistia.
Mas o tempo voou. Como folhas caídas das árvores.
Os filhos crescem. vamos às festas de formatura ou de casamento de crianças que um dia pegamos no colo, que pediam danoninho ao entrar na cozinha de nossa casa. Novas e belas crianças brincam na mesma antiga rua, como faziam nossos filhos. Haverá, até quando, esta Rua das Casuarinas para quem vier depois?
A vida continua e também o desamor pelas árvores, a necessidade esdrúxula de se fazer calçadas cimentadas como as da cidade lá embaixo, a esquentar o clima e os ânimos. O desejo de padronizar e moldar o que nasce diferente. A mesma cidade que as pessoas constroem, poluem e da qual depois querem fugir em direção ao vento sul mas... repete-se o mesmo vício do homem dito civilizado: trocar o verde do campo e do mato pelo cimento das casas. Até, quem sabe, o dia em que tudo vire um campo limpo. Por que, então, não morar em um apartamento?
Belo Horizonte está um quinto do tamanho de São Paulo e seu crescimento para o cinza parece o mesmo. Com o agravante de aqui estar o minério de ferro, dia após dia arrancado de suas entranhas para longe. O minério magnetiza, prende, explica também a timidez, o jeito cerimonioso do mineiro. Suas montanhas inspiram e nutrem, fascinam e abençoam mas somam um receio de olhar para o futuro, de cortar raízes, mas pudor de desmatar de cortar árvores não há.
A natureza continua a ser preterida e sacrificada em nome de um tipo de conforto, de novas construções. Mas mantem-se incólume o velho desapreço pela natureza: aqui, no que resta da Mata Atlântica, na Amazônia, pelo Brasil afora.