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Artigos-->Fragrância Feminina na Poesia - Maria Teresa Horta -- 30/01/2002 - 09:43 (Fernanda Guimarães)
Fragrância Feminina na Poesia Estamos dando continuidade a publicação destes pequenos artigos que visam mostrar um pouco da escrita poética feminina no cenário nacional e mundial. Pretendemos, tão somente, falar da emoção de nossas descobertas literárias ao nos depararmos com a vasta produção feminina na construção de uma identidade poética. É antes de tudo, uma gota de perfume que permitirá ao leitor curioso, buscar outras essências, a partir da publicação destes textos. Maria Teresa Horta Maria Teresa Horta nasceu em Lisboa em 1937. Participou ativamente do movimento cineclubista português, realizando com Antônio de Macedo o curta metragem “Verão Coincidente”, cujo enredo centra-se num poema de sua autoria. Frequentou a Faculdade de Letras em Lisboa, tendo pertencido ao movimento literário Poesia 61 . Participou do movimento em prol da renovação da música moderna portuguesa, onde foram musicados poemas de sua autoria, cantados por Nuno Felipe. Foi dirigente do Suplemento “Literatura & Arte” do Jornal “A Capital”. Colabora e dirige a secção de literatura da Flama e do semanário Expresso. Em conjunto com Maria Isabel Barreno e Maria Velho da Costa publica o livro “Novas Cartas Portuguesas” que é constituído por uma série de poemas e cartas baseados na história da freira Mariana Alcoforado. Esta obra suscitou um processo judicial, em decorrência de sua natureza transgressora, no que diz respeito à tradição patriarcal dominante. As "Três Marias", como então ficaram conhecidas as três escritoras, questionavam subversivamente o lugar da mulher na sociedade. Este livro propiciou em Portugal, um novo entendimento da condição feminina e da sua emancipação Livros Publicados: - Espelho Inicial, em 1960 - Tatuagem, in Poesia 61, em 1961 - Cidadelas Submersas, em 1961 - Verão Coincidente, em 1962 - Amor habitado, em 1963 - Candelabro, em 1964 - Jardim de Inverno, em 1966 - Cronista Não é Recado, em 1967 - Minha Senhora de Mim, em 1971 - Novas Cartas Portuguesas (com Maria Velho da Costa e Maria Isabel Barreno), em 1971 - Ana, em 1974 - A Paixão Segundo Constança H., em 1974 - Educação Sentimental, em 1975 - Ema, em 1975 - Mulheres de Abril, em 1977 - Os Anjos, em 1983 - Poesia Completa, 2 v., em 1983 - Minha Mãe, Meu Amor, em 1986 - Rosa Sangrenta, em 1986 - Antologia Poética, em 1994 - Destino, em 1997 Peça de Teatro: - Delator, incluída no volume Novíssimo Teatro Português Romance: - Ambas as Mãos sobre o Corpo, em 1970 Alguns poemas de Maria Teresa Horta: Poema Sobre a Recusa Como é possível perder-te sem nunca te ter achado nem na polpa dos meus dedos sem ter formado o afago sem termos sido a cidade nem termos rasgado pedras sem descobrirmos a cor nem o interior da erva Como é possível perder-te sem nunca te ter achado minha raiva de ternura meu ódio de conhecer-te minha alegria profunda Poema Antigo O homem que percorro com as mãos e a lua que concebo na altitude do tédio Só o oceano penso paralelo — ventre à praia intata das janelas brancas com silêncio ciclamens-astros entre as vozes que calaram para sempre o verbo — bússola com raiz — grito de relevo O homem que percorro com as mãos a estátua que consinto a lua que concebo. Dúvida Amor a tua voz e a minha sensação de vácuo de liberdades paralelas ontem esquinas encontradas no ângulo dos lábios Amor a tua lâmpada de nevoeiro sulcado manhãs de aves súbitas com noites inventadas nada é o teu rosto insetos de vertigem sem paisagem. Anjos Mulheres – VI As mulheres voam como os anjos Com as suas asas feitas de cristal de rocha da memória Disponíveis para voar soltas... Primeiro lentamente uma por uma Depois, iguais aos pássaros fundas... Nadando, juntas Secreta a rasar o chão a rasar a fenda da lua no menstruo por entre a fenda das pernas Às vezes é o aço que se prende na luz A dobrarmos o espaço? Bruxas pomos asas em vassouras de vento E voamos Como as asas lhe cresciam nas coxas diziam dela que era um anjo do mar Rondo alto, postas em nudez de ombros e pernas perseguindo, pelos espaços, lunares da menstruação e corpo desavindo Não somos violência mas o vôo quando nadamos de costas pelo vento até à foz do tempo no oceano denso da nossa própria voz Sabemos distinguir a dormir os anjos das rosas voadoras pelo tacto? Somos os anjos do destino com a alma pelo avesso do útero Voamos a lua menstruadas Os homens gritam - são as bruxas As mulheres pensam - são os anjos As crianças dizem - são as fadas Fadas? filigrana cintilante de asas volteando no fundo da vagina Nadamos? De costas, no espaço deste século Mudar o rumo e as pernas mais ao fundo portas por trás dobradas pelos rins Abrindo o ar com o corpo num só golpe Soltas, voando até chegar ao fim Dizem-nos que nos limitemos ao espaço Mas nós voamos também debaixo de água Nós somos os anjos deste tempo Astronautas, voando na memória nas galáxias do vento... Temos um pacto com aquilo que voa - as aves da poesia - os anjos do sexo - o orgasmo dos sonhos Não há nada que a nossa voz não abra Nós somos as bruxas da palavra Gozo I Linho dos ombros ao tacto já tecido Túnica branda cingida sobre as espáduas Os rins despidos no fato já subido as tuas mãos abrindo a madrugada Linho dos seios na roca dos sentidos a seda lenta sedenta na garganta a lã da boca cardada no gemido e nos joelhos a sede que os abranda Linho das ancas bordado de torpor a boca espessa o fuso da garganta Gozo II Desvia o mar a rota do calor e cede a areia ao peso desta rocha Que ao corpo grosso do sol do meu corpo abro-lhe baixo a fenda de uma porta e logo o ventre se curva e adormece e logo as mãos se fecham e encaminham e logo a boca rasga e entontece nos meus flancos a faca e a frescura daquilo que se abre e desfalece enquanto tece o espasmo o seu disfarce e uso do gozo a sua melhor parte Gozo IV Que tenhas de mim o contorno incerto acertado nas linhas do teu corpo os dentes nos lóbulos e no pescoço os lábios a língua a cobrirem os ombros Gozo V Vigilante a crueldade no meu ventre A fenda atenta e voraz que devora o que é dormente a febre que a boca empresta a vela que empurra o vento a vara que fende a carne a crueldade que entende o grito sobre o orgasmo que me prende e me desprende Gozo VI São de bronze os palácios do teu sangue de cristal absorto ensimesmado São de esperma os rubis que tens no corpo a crescerem-te no ventre ao acaso São de vento - são de vidro são de vinho os líquidos silêncios dos teus olhos as rutilas esmeraldas que sozinhas ferem de verde aquilo que tu escolhes São cintilantes grutas que germinam na obscura teia dos teus lábios o hálito das mãos a língua - as veias São de cupulas crisálidas são de areia São de brandas catedrais que desnorteiam (São de cúpulas crisálidas são de areia) na minha vulva o gosto dos teus espasmos Gozo VIII Em cada canal a sua veia o veio que entumece no fundo da sua teia Em cada vento o seu peixe no tempo que a água tenha sedosa na sua sede viciosa em sua esteira Da seda o tacto e o suco dos lábios à sua beira como se fosse um beiral do corpo p ra língua inteira ou o lugar para guardar o punhal que se queira Em cada punho o seu ócio um cinzel de lisura com a doçura do pranto da prata e bronze a secura O travesseiro não apoia as pernas já afastadas mas ajusta as ancas dadas Escalada que se empreende na pele das tuas nádegas Em cada corpo há o tempo no gozo da sua adaga Mas só no teu há o espasmo com que o teu pênis me alaga Gozo IX Ondula mansamente a tua língua de saliva tirando toda a roupa... já breves vêm os dias dentro de noites já poucas. Que resta do nosso gozo se parares de me beijar? Oh meu amor... devagar... até que eu fique louca! Depois... não vejas o mar afogado em minha boca! Gozo X São de alumínio os flancos e de feltro a língua de felpa ou seda a abertura incerta que cede breve a humidade esguia presa no quente do interior da pedra Ou musgo doce de haste sempre dura de onde pendem seus dois mansos frutos que a boca aflora e os dentes prendem a tatear-lhes o hálito e o suco Gozo XI Conduzes na saliva um candelabro aceso um chicote de gozo nas palavras E a seda do meu corpo já te cede neste odor de borco em que me abres Sedenta e sequiosa vou sabendo a demorar o tempo que se espraia ao longo dos flancos que vou tendo as tuas pernas vezes teu ventre A tua língua vezes os teus dentes na pressa veloz com que me rasgas Gozo XII São tuas as pálpebras dos meus dias tal como a laranja do lago estagnado é a lua do lago ao meio dia quando o sol dos ombros está rasgado São teus os cílios que as noites utilizam é tua a saliva dos meus braços é teu o cacto que no ventre incerto debruça levar os seus orgasmos Não tenho mais que te dizer das coisas que tudo o mais te faço eu deitada enquanto sentes que o teu corpo cresce por dentro do mundo na minha mão fechada A Voz Da tua voz o corpo o tempo já vencido os dedos que me vogam nos cabelos e os lábios que me roçam pela boca nesta mansa tontura em nunca tê-los... Meu amor que quartos na memória não ocupamos nós se não partimos... Mas porque assim te invento e já te troco as horas vou passando dos teus braços que não sei para o vácuo em que me deixas se demoras nesta mansa certeza que não vens. Joelho Ponho um beijo demorado no topo do teu joelho Desço-te a perna arrastando a saliva pelo meio Onde a língua segue o trilho até onde vai o beijo Não há nada que disfarce de ti aquilo que vejo Em torno um mar tão revolto no cume o cimo do tempo E os lençóis desalinhados como se fosse de vento Volto então ao teu joelho entreabrindo-te as pernas Deixando a boca faminta seguir o desejo nelas. Fonte de Pesquisa: - Sites: http://www.lumiarte.com/luardeoutono/mariathorta.html http://www.instituto-camoes.pt/arquivos/literatura/arqvmthorta.htm http://www.instituto-camoes.pt/bases/100livros/3marias.htm © Fernanda Guimarães Em 30.01.02 Visite minha HP: http://br.geocities.com/nandinhaguimaraes