Há quem fique indignado com o Rio de Janeiro presente nas manchetes de jornais de todo dia. Há quem diga "É alarmismo, a situação não é essa, não é assim que funciona."
Na semana passada conheci uma situação absurda, já havia imaginado, mas não tinha a certeza de existir.
Enquanto tomava cerveja num bar do Centro do Rio com um amigo, chega um rapaz de trinta e poucos anos ao qual fui apresentado. Rapidamente ele começa a falar das dificuldades da vida "Tá ligado?!" E emenda: "Amigo, sou trabalhador do cás do porto há 16 anos, fui criado aqui na Saúde. A vida tá difícil, por isso eu faço outras paradas."
Fiquei observando. Nestas horas vale o espírito jornalístico: ouvidos atentos, memorizando o máximo de informações possíveis. Continuou.
_ Tava parado ali no outro bar, anteontem, chegou o cana. Me pegou com uma pistola. Me chamou pra conversa e disse, o que que tu tem pra me falar? Pô, mandei a real, tu não me pegou à toa, sabe que eu sou vagabundo, mas libera o pessoal que tava comigo, porque cê sabe que eu trabalho sozinho.
Aí descobre-se o crime organizado. Ou talvez viva-se de perto o que Zuenir Ventura já denunciava em Cidade Partida: a polícia é o grande organizador do crime.
_ O cana me pediu R$ 1.000,00 pra me liberar. Eu falei que só tinha R$ 500,00. Pra ele não interessava. Pedi a arma de volta pra fazer o ganho e ele me liberar. Ele me repondeu Cê tá louco? Corri em casa peguei um 38 e fui pra Rio Branco (Avenida Rio Branco, no Centro do Rio). Fui na boa. Peguei um boy descendo de um prédio. Prendi R$ 2.500,00. Fui procurar o cana lá na Cinelândia e falei pra ele. Tá aqui, fiz contigo trato de homem e homem cumpre com a palavra. Dei mais R$ 500,00 na mão dele.
Bem, o nosso anti-herói continua solto pelas ruas do Rio de Janeiro, mas a história não terminou. Ele relatou coisas de sua adolescência. Contou que os policiais tinham trato feito com os menores, recebiam uma cota certa dos assaltantes do Centro do Rio. Na época, todos mais ou menos da mesma idade que ele. Apesar disso, diz nunca ter matado ninguém, que é "apenas" assaltante.
Vejam quem criou a serpente. A própria polícia. Quem organiza o crime para receber um percentual de seu produto final é quem recebe - mesmo que mal - para nos proteger. Neste dia, perdi as esperanças em relação à alardeada segurança pública.