Não há como estudar em minúcias as variantes da língua se o aluno não compreender que seu idioma natal hoje une oficialmente oito povos distintos em 4 continentes. Ele tem de compreender que o português é muito mais que uma amarra lexical disposta numa corrente sintática (in)flexível; o português é o idioma pelo qual ele se comunica, adquire e transfere conhecimentos e valores inerentes a uma sociedade complexa. E esse mesmo idioma o torna singular - é sua Pátria, como afirma Fernando Pessoa -, apesar dele não estar sozinho no mundo, mas fazendo parte de uma “aldeia” que se vê e se transforma a cada instante, numa inquietante soma de riquezas intelectuais.
É importante, portanto, que ele conheça a CPLP – Comunidade de Países de Língua Portuguesa e saiba quais países a integram, fazendo do português um idioma único e múltiplo ao mesmo tempo. Ainda, por meio deste projeto, o aluno há de compreender que, atualmente, há duas línguas portuguesas - uma europeia, falada por Portugal e outros seis países de menor relevância, e outra americana, pelo Brasil
Ao iniciar o trabalho, a criança deve assistir a um vídeo de um minuto sobre a CPLP1 para entender sua respectiva importância no cenário global enquanto gestora da língua; depois, o professor pode ilustrar, por meio da explanação, a cooperação promovida por essa entidade nas áreas do conhecimento, da economia, na preservação dos costumes locais e na valorização constante da própria língua, cujos relatos da Wikipédia2 tratam-na como a quinta mais falada no mundo. Há que se destacar que o próprio acordo ortográfico, hoje em vigor no Brasil e parte dos falantes lusófonos, é uma ação exclusiva do colegiado da CPLP com a intenção de atenuar as diferenças entre as duas línguas, que, a priori, parecem pequenas, mas são gigantescas, quando observadas em sua essência.
Diferenças estas que poderão ser exemplificadas ao aluno por meio do texto “Como se diz no Brasil? Como se diz em Portugal?”3, quando, a partir de um pequeno glossário, ele perceberá como a sua língua natal é rica, múltipla e grandiosa, como diria Camões há meio milênio. Neste glossário é possível perceber a presença de palavras homógrafas heterofônicas, heterográficas, homófonas e mesmo parônimas. Exemplo de riqueza e contradição/variação linguística (talvez uma armadilha) é o termo “fato”. Para os brasileiros representa um acontecimento; para os demais falantes, uma peça do vestuário (terno). Em contrapartida, para um nativo de Portugal, um acontecimento só poderá ser tratado por “fato” se se acrescentar em seu radical a consoante “c” - que deverá ser pronunciada com veemência -, tornando-a “facto”. Este termo, no léxico português brasileiro, inexiste.
Há que se ressaltar que apenas o Brasil fala diferente dos outros falantes, que optaram pela maneira europeia de se expressar, talvez pela proximidade com a ex-metrópole. Todavia, o português só tem alguma importância no imaginário global porque o Brasil o tem como seu idioma oficial, afinal, dos 300 milhões de falantes aproximados, 190 milhões estão na América do Sul, enquanto os outros 110 estão distribuídos entre as 7 nações-irmãs. O Brasil adota um sotaque próprio, um jeito diferente de falar e de escrever, de conjugar os verbos e construir sentenças literárias legítimas devido à influência de vários outros povos (italianos, alemães, franceses) – daí a adjetivação de variação diatópica para a regionalização interna da língua nativa.
No Brasil, o jeito contido de falar do povo lusitano, o uso da 2ª pessoa do discurso (tu/vós), a maneira sisuda de tratar estrangeiro dá lugar a uma afetividade demarcada pelo modo expansivo de falar, pela falsa intimidade denotada pelo uso quase inquietante da 3ª pessoa do discurso (você). O que nos outros países soaria como falta de educação; aqui, aparenta simplesmente o oposto, ou seja, cordialidade. Não bastassem todas estas diferenças regionais entre os países, a língua ainda vive, internamente, a variação diafásica, em que perdura a diferença de fala ou registro e a diastrática, que ocorre conforme o nível socioeconômico do falante.
Para que um estudante compreenda todas essas informações, é importante que o trabalho se inicie no 6º ano, quando a criança desenhará o Mapa-Múndi, pintando apenas os países lusófonos que integram a CPLP. Uma maneira lúdica de identificar a distância que há entre todos, inclusive entre os africanos e o Brasil. No 7º ano, quando ele já compreende a multiplicidade da língua, deve-se aprofundar as propostas do órgão internacional gestor da língua ( O que é a CPLP? Qual sua função? Onde fica sua sede? Qual sua principal missão?). No 8º, aplica-se o glossário com as variações linguísticas, quando se pede a socialização das novas informações com os pais. No 9º ano, mostra-se a forma dos portugueses falarem por meio de vídeos, com destaque para o sotaque carregado, o gestual explosivo e a face carrancuda ou falsamente moldada para se vender uma ideia. O vídeo “Pingo Doce”4 é um exemplo. Propaganda de um dos principais supermercados das terras de Cabral, mostra Ricardo Pereira com o sotaque original (aquele que a Globo arrancou a tapas antes de contratá-lo para atuar nas telenovelas brasileiras) informando aos conterrâneos que a rede não aumentaria o IVA – principal imposto da zona do Euro – por causa da crise europeia.
Nos 1º, 2º e 3º anos do Ensino Médio, é importante que o aluno tenha contato com imigrantes daqueles países e troquem ideias, seja por meio de chats, do Facebook e, se possível, por meio do contato pessoal. O trabalho deve fazer parte do currículo e, uma vez por ano ser retomado durante uma semana (5 aulas), de preferência em maio, quando se comemora o mês da língua, para que o conhecimento se fixe e dele surjam novas ideias, novas experiências e a percepção de que a regionalização não empobrece a língua; pelo contrário, está enraizada na própria cultura local.
REFERÊNCIAS:
Fonte1: CPLP. Uma oportunidade histórica, NET, Portugal.
Fonte2: WIKIPÉDIA. Língua Portuguesa, NET, Portugal.
Fonte3: BARBOSA, Claudia. Como se diz no Brasil? Como se diz em Portugal?, NET, Brasil.
Fonte4: YOUTUBE. Pingo Doce: zero aumento de IVA, NET, Portugal.
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