Dizem que caminhada longa começa com o
primeiro passo. Então, me sentei aqui, com aquele “a saucerful of secrets”, do Pink Floyd, de 1968, e liguei o editor
de textos pensando no que poderia escrever de forma a gerar uma ideia que
viesse a, futuramente, fazer alguma diferença para o País. Foi quando,
finalmente, depois de revirar a mente, afastar o que não importava e retomar ao
menos parcialmente o foco, me vi novamente pensando em algo que vem tomando
conta do meu pensamento nos últimos meses: a importância do agente de segurança
penitenciária não apenas como servidor público estadual ou federal, mas,
também, perante a sociedade.
Mas a que me refiro? Ressocialização?
É óbvio que não, não é preciso debater com os colegas a grande falácia que é
esta palavra, que há muito se tornou presente nas bocas daqueles que conhecem o
sistema penitenciário apenas de seus escritórios e que não possuem, na sua
grande maioria, conhecimento prático sobre o assunto, pois, quem está no dia a
dia vendo a coisa frente a frente, sabe que o detento tem tanto interesse em
retornar à sociedade e ter uma vida normal quanto índio tem em aceitar ser
catequisado. O que gente como nós, que levantam cedo, tomam seu café e saem pra
trabalhar, conhecem como vida normal, aqueles que estão acostumados ao cárcere
transformam em objeto de desdém, de deboche, independente do fato de seu
próprio modo de vida condená-los não apenas a uma cela menos espaçosa que nossa
liberdade de ir e vir, mas, também, à falsa ilusão de que seu padrão de vida é
o correto.
Há muito a ressocialização é vista
como comédia, não apenas pelo fato de ser uma falha, pois quem conhece a coisa
a fundo sabe que preso não quer trabalhar e, sim, procurar remissão de pena pra
que possa voltar à rua e cometer, se não os mesmos delitos, outros ainda piores
se for preciso, mas, também, pela simples questão de ter se tornado um conceito
tão falho, tão deficiente, que corre simplesmente o risco de não existir e ser
apenas uma ilusão, um fantasma, um delírio que ocupa a mente daqueles que
pensam conhecer a mente criminosa ou que simplesmente simpatizam com ela de tal
forma a ponto de compactuar direta ou indiretamente com o criminoso.
E qual o papel do agente penitenciária
diante deste quadro? Tal qual anjo encaminhado ao inferno para manter seus
portões fechados, é nossa função cuidar para que o que é nocivo permaneça trancafiado,
mas será que o serviço termina aí? Após refletir sobre o assunto, cheguei à
conclusão que não chega sequer perto disso. Sendo as prisões o esgoto da
sociedade, aonde é enviado tudo aquilo que não serve para conviver com ela,
reduto cada vez mais superlotado, beirando à impossibilidade de desempenho do
serviço, passei a me perguntar se não é do agente de segurança penitenciária a
responsabilidade, para não dizer o interesse, em opinar, para não dizer cobrar
e intervir, em outros aspectos relevantes ao interesse público como educação e
emprego.
Mas no que isso diz respeito ao nosso
cargo? Tudo! Uma vez que a sociedade, e não apenas o governo, falha no que diz
respeito à educação, alicerce de qualquer Estado, e na geração de trabalho,
cuja importância não preciso enfatizar, o presídio recebe novos moradores, que
passarão por sua entrada seja em face da pouca oportunidade que possuem ou
devido a seu desequilíbrio moral, que os leva ao cometimento de inúmeros
crimes. O que tento explicitar aqui é que a cobrança por melhoras não vai
apenas até o salário, o porte de arma ou o que quer que esteja sendo pleiteado
pela categoria. O problema da remuneração não será resolvido a menos que outras
áreas como a cobrança de impostos sobre alimentos, remédios, vestuário,
educação, moradia, transporte, luz e água não sejam erradicados ou
drasticamente reduzidos; a superlotação é consequência de um sistema penal que
não só não assusta quem é custodiado do Estado como chega ao ponto de, até
mesmo, estimular a perpetuação da conduta, para não dizer carreira, criminosa,
em face do sem número de benefícios oferecidos mesmo a quem comete crimes
hediondos, que não preciso citar aqui para não esticar o assunto, como pela
existência de penas extremamente brandas que transformam nosso sistema penal em
motivo de piada. Consequentemente, o infrator não tem medo de ser preso, a
notícia corre mundo afora, estimula a má conduta, contando ainda com o fato de
se viver em um País onde obrar mal é praticamente um mantra sagrado, fazendo
com que a apologia ao ato criminoso se torne direta e indiretamente presente no
dia a dia do cidadão, levando um número cada vez maior de pessoas a serem
aprisionadas, de forma que apenas uma educação diferenciada pode mudar.
Resumidamente falando, é nisso que
precisamos focar a fim de que haja uma mudança verdadeiramente significativa no
sistema penitenciário, pois, para que a situação melhore para nós, ela deve
estar melhor para toda a sociedade como um todo. Somente melhorias na geração
de empregos, na educação, na redução de impostos, pode-se alcançar mudança
verdadeira. Qualquer outra forma de tentar aliviar os problemas atuais a curto
prazo servirá apenas para tapar o sol com a peneira e será provisória, assim
como a cocaína acabou se mostrando mais nociva que a própria morfina.
Mantenhamos o foco...