O CAMALEÃO MENSAGEIRO
Narrativa popular da Guiné-Bissau
Narrador: Faustino M. Cunha
Recolha e fixação do texto: João Ferreira
Data de publicação: 28 de setembro de 2023
Era uma vez. Morreu um animal na floresta.
Reuniram-se as mulheres grandes(1) esperando os parentes do animal para realizar o funeral e ver os problemas de herança.
As mulheres começaram a verificar quais eram os animais mais jovens e mais rápidos ali reunidos para ver quem poderia levar o recado ou mensagem mais à família na tabanca(2). Entre esses animais estavam o leão, a onça, o saninho (3) e o camaleão.
Uma das mulheres grandes, ali presentes, apontou para o leão. Mas as outras recusaram por ser lento. Pensaram então na onça. Mas houve a mesma reação. Foi julgada lenta. Depois pensaram no saninho(2). Reprovado também.
Enquanto decorria discussão sobre o mensageiro ideal para levar o recado à tabanca, um camaleão, presente no local, viu uma mosca, esticou a língua e conseguiu pegá-la com incrível rapidez.
Então uma das senhoras disse:
- É melhor enviar o camaleão porque é rápido como acaba de demonstrar.
O camaleão não recusou. Aceitou.
Devia seguir então para a tabanca a fim de dar o recado aos parentes do animal falecido.
Passou um dia e o camaleão não apareceu. Passaram dois dias e aconteceu a mesma coisa. Não regressou.
Ao fim de dois dias, as mulheres começaram a reclamar porque o cadáver estava apodrecendo. E comentavam:
- O camaleão aceitou ir dar o recado e até agora não apareceu. É imoral, comentavam.
O camaleão, porém, havia começado a trilhar o seu caminho e dada a sua lentidão não estava muito longe da casa, podendo ouvir todas as conversas e xingamentos e protestos.
Resolveu então regressar não pelo caminho normal, mas por um atalho mais próximo pelo lado da janela.
Levou um dia para subir a janela. Ao fim do terceiro dia, assomou ao parapeito e as mulheres surpresas exclamaram:
- Até que enfim!!! Você chegou...
E como todo o mundo estava olhando para ele, o camaleão disse:
- Se continuarem me xingando, eu não vou fazer o recado...
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(!) Na língua crioula usada na Guiné Bissau, "grande" sigmifica "velho", "pessoa veneranda" ou com algum cargo importante. "Mulheres grandes" são as mulheres mais velhas.
(2) "Tabanca": nome que na língua rioula da Guiné Bissau significa "aldeia indígena".
(3) "Saninho" era o nome usado pela população guineense para designar um pequeno animal roedor semelhante ao esquilo
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