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Suverteu...?
Desde muito, e sempre, acho que vou conseguir escrever uma obra, ou um opúsculo que seja, sobre vocábulos e expressões de meus tempos infantis do Brumado - distrito outrora, bairro, agora - da cidade tricentenária de Pitangui, localizada no Centro-Oeste de MG, cantada em pelo menos três hinos oficiais.
No minha meninice, a parte a crendice, o rádio falou e disse. O primeiro televisor chegou ao povoado já no finzim da década de 50 e, como era único e posse do gerente da fábrica de tecidos, o Seô Afonso, com seu chuviscar quase perene, pouco ou nada impactou no entender e no falar de nossa gente.
Verdade que a escola nos dava a oportunidade da introdução ao plural, à concordância e às desinências, mas o efeito era nulo, no entanto, no tocante ao falar dos mais véi. Que era o caso particular de tia Vicentina, sua irmandade, e praticamente o resto da comunidade. Papai, mesmo com pouca escolaridade, e tirante o L solto que sempre transformava em R, pelo seu afinco à leitura das folhinhas do Sagrado Coração e dos almanaques, bem como à observação atenta às "rádias" que escutava, que se não vinham do Rio de Janeiro, vinham de Aparecida do Norte, nas vozes dos padres Vítor e Galvão, principalmente.
Mas retornemos a Ticintina e à vizinhança que nos rodeava mais de perto. E palavras como cancela (para portão), assungá (pra levantar),
aluí (pra mexer), sabucá (pra bajular), istumá (pra provocar), eram uma constante no nosso falar e mais ainda, ouvir, diário. O menino Chico do Duca, vizinho de cerca, que viera da Charneca, doutrinou-me com termos como purduzi, trocê, inxertá, etc; de dona Nita do Tôe Pinto, vizinha frontal lembro-me do briquitá (para trabalhar), que nela, com aquela perrada infindável de meninada, era antes, durante, depois e incessante; de mamãe mesmo provieram o ispicula e o isbiutá (ambos ligados à curiosidade, nem sempre benfazeja...Tilia, irmã de papai e de Ticintina, nos introduzia expressões ora denotativas dum certo sarcasmo como marmota, ora eufemísticas, tal como obrar. Sobretudo, se no fundo do quintar...
Fico pensando em avançar na pesquisa, sistematizá-la, dirigi-la para ver se produzo algo convincente e substantivo, mais abrangente sobre o falar doutrora mas quando mais preciso eu, cadê a disposição, pelo jeito, suverteu...
Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 25/10/2017
Código do texto: T6152646
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Comentários
7
Paulo Miranda
A
Afonso Castro Gonçalveshá 1 ano
Papai isbiutava, ispiculava muito. Já mamãe, vivia no caladume. Timarquim chamava Timunda de marmota. Zé do Celo istumava briga na vizinhança.
Calada Euhá 3 anos
Houve um tempo da valorização da linguagem, da fala. Hoje, tem quem usa Smilies para expressar qualquer sentimento. O nosso rico vocabulário virou mendigo. Great job, Sir Paul!
Iolandinha Pinheirohá 4 anos
Super interessante, querido. Parabéns pelo texto.
Aloysiahá 4 anos
Conheço a maioria dessas palavras pois lá no interior de Sta Catarina onde passei a minha infância e adolescência era assim que meus avós e tios falavam.São familiares: buchudo, pramódi, carece, troxe, ispiculá, isbiotá, barrê, dificulidade...
Momihá 4 anos
Maneiro! Só de teu Recanto já sai um calepino inteiro!
W
Walter Gonçalves Taveirahá 4 anos
Recentemente assisti uma palestra de um professor idoso em que ele afirmava que todas essas palavras não constituem erros, mas o dialeto brasileiro. E para mim isto faz sentido, pois foi assim que se formaram os dialetos europeus.Está nos faltando alguém com disposição para reconstituir esse dialeto.
E
Epiphânio Camillohá 4 anos
I prumódi terminá, acarece cumeçá.
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