O BRASIL ESTÁ SE PROJETANDO NO JAPÃO
L. C. Vinholes
10.10.2025
Nota: dois motivos justificam minha decisão de republicar esse texto no site <www.usinadeletras.com.br>: 1º) Na publicação de 2 de julho de 1967, no Dário Popular de Pelotas, foi informado que ele estaria disponível no site o que há muito não está correto. Esse último site era parte da tese de Lilia de Oliveria Rosa, e que, por razões de ordem técnica, deixou de existir, não estando mais disponível. 2º) O texto desse artigo resultou de uma entrevista autorizada pelo jornalista Clayr Rochefort (1929-2012), redator-chefe do jornal, incentivando ao jovem jornalista Irajá Nunes. O título do texto agora publicado resulta da minha decisão de eliminar as três primeiras palavras do original: Vinholes conta como. Mantenho a linguagem da entrevista na qual figurava foto tirada pelo jornalista-fotógrafo Wilson Lima, com o rodapé “O nosso homem em Tokyo[i]”.
Sobre Irajá Nunes
O jornalista Irajá Nunes um jovem, amistosamente tratado por “foquinha” ou Mirim e que fora uma promessa concretizada na equipe, não só pela sua dedicação, mas também pela sua habilidade e disposição habitual. Conheci Irajá Nunes no final dos anos 1940 e primeiros de 1950, antes de minha ida para São Paulo e, posteriormente, para Tokyo, me ausentando por mais de dez anos. Seus últimos momentos foram no Banco de Sangue da cidade cercado por colegas e amigos acompanhando as transfusões a que se submetia, mas terminou sem vida como resultado do acidente de trânsito ocorrido em 6 de outubro de 1977.
O jornalista Rubens Spanier Amador resumiu o que todos sentiram com a perda do colega e amigo: “Amigos, colegas e a cidade inteira se inundaram pela impotência ante a fragilidade da vida e a injustiça incompreensível de perder o convívio com um homem tão lúcido, gozador da vida e ainda com um projeto de livro em mãos, que nunca foi editado. O repórter que chegara adolescente agora se ia aos 41 anos”.
Minha convivência com Irajá Nunes foi muito pouca, nossos encontros eram esporádicos quando eventualmente frequentava a redação do Diário Popular. Esta nova publicação da entrevista faço em memória de Irajá Nunes, mantendo-me fiel ao texto por ele produzido.
O retorno
Há 12 anos ele não vinha a Pelotas. Quinta feira passada irrompeu pela Redação. Mais gordo. Elegante. Houve abraços, risadas, reminiscências apressadas, confraternização. Espocou o “flash”. A luz forte fez Luiz Carlos Lessa Vinholes piscar. Ele é Adido Cultural da Embaixada do Brasil em Tokyo. Casou na República da Coréia. Tem uma filha, Irani, que este mês completará dois anos. Sua última viagem à terra natal foi em 1955. De lá para cá, em sua opinião, Pelotas mudou um bocado. Cresceu. Ganhou novo perfil. Vinholes elogiou o prefeito, a quem antes visitara. Revelou estranhar a umidade (“No Japão cai neve, mas o clima é seco”) e pôs-se à disposição do repórter, seu ex-colega dos bons tempos. O tempo disponível estava escasso, lembrou. Vinholes é o mesmo tipo dinâmico e apressado que, entre outros serviços à causa da promoção municipal, conseguiu estabelecer os laços de irmandade entre Pelotas e Suzu.
Levando o Brasil ao Japão
Inicialmente, disse Vinholes: “Na Embaixada do Brasil em Tokyo, como encarregado do Setor Cultural, tive oportunidade de desenvolver trabalho em prol da difusão da arte e da cultura brasileira naquele país. É desnecessário dizer que, nos últimos anos, a inteligente orientação do embaixador Álvaro Teixeira Soares possibilitou um incremento ainda maior no intercâmbio entre Brasil e Japão. Cumpre ressaltar que o embaixador pessoalmente visitou as cidades de Suzu e Kanazawa, ambas situadas na Província de Ishikawa, dando provas de interesse pela aproximação e o fortalecimento dos vínculos entre estas cidades japonesas e Pelotas e Porto Alegre”.
No terreno das artes
Continua: “A promoção das Artes Plásticas e do Teatro brasileiro no Japão foi marcante. Nossos gravadores, pintores e autores de peças teatrais são conhecidos do público. Entre os gravadores quero ressaltar alguns nomes gaúchos: Zorávia Bertiol, Vasco Prado, Vera Barcelos, Danúbio Gonçalves e Flávio Pons. O primeiro trabalho de importância do nosso teatro lá apresentado foi a peça A raposa e as uvas, de Guilherme Figueiredo, hoje representada anualmente por grupos profissionais e amadores. Ainda em fevereiro último, despertou a atenção do público japonês a peça de Agostinho Olavo intitulada O Anjo. Dentro de alguns meses, por outro lado, será editada em Tokyo uma antologia de peças brasileiras, traduzidas para o japonês de autoria de Figueiredo, Olavo, Pedro Bloch, Machado de Assis, Raquel de Queiroz e Nelson Rodrigues”.
E frisa: “Meus trabalhos de composição e minhas poesias encontraram boa aceitação. Uma de minhas obras, para conjuntos de câmara, foi apresentada no I Festival de Música Contemporânea de Vanguarda realizado em Osaka, o maior centro industrial do Japão e que mantém um movimento cultural tão importante e intenso quanto o de Tokyo. Minhas poesias, apesar de pertencer à vanguarda da poesia contemporânea, encontram espaço nas revistas especializadas que se editam em todos os grandes centros do Japão”.
As “cidades irmãs”
Vinholes passa para outro tema, aliás de grande interesse para o Município: “A concretização do elo que uniu fraternalmente Pelotas e Suzu foi algo que me deu muita alegria. Apesar de ser distante de Pelotas, nunca esqueci a Princesa do Sul”!. E passando às perspectivas de intercâmbio entre esta terra e sua irmã antípoda, afirma: “Estou certo de que, em futuro não muito distante, poderemos – nós todos, pelotenses – beneficiarmo-nos dos conhecimentos de nossos irmãos de Suzu no que diz respeito à técnica agrícola. Na “grande casa” que é o nosso Município estou seguro de que haverá, sempre, um lugar a mais para recebermos aos nossos amigos de lá, filhos de Suzu.
E concluiu: “Ao lado da parte cultural artística hão de estreitar-se os interesses práticos, econômicos. Quando isso acontecer, poderemos no dar por satisfeitos”. – I.N.
[i] Desde que em 15 de abril de 2011 passou a vigorar no Brasil o novo acordo ortográfico, incorporando as consoantes K, W e Y no nosso alfabeto, passei a usá-las nos nomes topográficos japoneses.
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