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Artigos-->Música aleatória brasileira 40 anos da Instrução 61 -- 04/12/2025 - 13:19 (LUIZ CARLOS LESSA VINHOLES) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Música aleatória brasileira

40 anos da Instrução 61

 

Nota: Em 2001 fui convidado a escrever um artigo sobre as Instruções 61 e 62, artigo que tinha como autor não o meu nome, mas sim o pseudônimo que, poucas vezes, usei: Luiz Magloire.

 

Não tenho notícia desse artigo ter sido publicado, mas na memória do meu computador está o texto que reproduzo a seguir, uma vez que continua válido e dele constam informações sobre as instruções elas mesmas e sobre as ocasiões mais significativas do seu uso.

 Morando no Japão desde 1957 e conhecendo, nas rodas de música de vanguarda, intérpretes interessados em música contemporânea, Vinholes foi convidado a participar da reunião programada para a passagem do ano de 1961 para 1962, reunião no estúdio do Grupo de Música Nova do pianista Tomohisa Nakajima, no bairro de Shibuya, em Tokyo. Este encontro se transformaria em um marco na vida do compositor e da música brasileira.

Para mostrar aos amigos, Vinholes levou uma coleção de 100 cartões, de mais ou menos doze centímetros de lado, divididos em quatro grupos de vinte e cinco cartões cada um, tendo cada grupo sete cartões riscados com uma linha longa, sete com uma linha curta, sete com um ponto bem no centro e quatro em branco. As linhas longa e curta quando na horizontal, representando som/nota longa e nota curta, respectivamente, e quando na vertical maior e menor aglomerado de sons/notas. O ponto representando sempre um som/nota curta e o cartão em branco o silêncio. A certa altura, começou a leitura de partituras enquanto era aguardada a meia-noite. Não tardou a chegar o momento de Vinholes apresentar seus cartões. Cada grupo de cartões foi entregue a quatro dos presentes que, chamados colaboradores, se colocaram em frente a quatro instrumentistas. A todos foi explicada a forma de manuseio e leitura dos cartões e não tardou muito a surgir o primeiro resultado do seu uso. O exercício, com flauta, violino, piano e “uchiwa-daiko” - uma espécie de tambor budista sem caixa de ressonância -, durou por mais de meia hora. Além de fotos, fita magnetofônica, com gravação de cerca de cinco minutos, documenta o que aconteceu naquele evento que foi a primeira prática de música aleatória por iniciativa de um compositor brasileiro. Chegada a meia-noite, Tomohisa Nakajima com Vinholes e os outros amigos dirigiram-se ao vizinho templo xintoísta Meiji Jingu para brindar a chegada do ano novo e escutar as 108 badaladas dos sinos dos mais importantes templos espalhados por todo o Japão.

 

 

O pianista Tomohisa Nakajima usando a Instrução 61
tendo ao lado a colaboradora mostrando os cartões

 

 

Desde então, os cartões de Vinholes passaram a ser conhecidos por Instruções. Em Tokyo, a revista Design nº 37, edição de setembro de 1962, publicou a Instrução 61, para quatro instrumentos quaisquer, e a Instrução 62, para instrumento de teclado, com reprodução dos cartões e texto em inglês e japonês. Em 16 de maio de 1962, graças aos contatos com o pianista Sebastian Benda, que estivera no Japão, com o músico e jornalista José Luiz Paes Nunes, o jornal O Estado de São Paulo publicou o texto da Instrução 61.

Vinholes continuava pouco conhecido no Brasil. Tanto assim que, em fins de 1963, no jornal Weril, de São Paulo, encontra-se o seguinte comentário: “compositor desconhecido completamente entre nós, obtem sucesso no Japão ao ser incluída sua peça Kasumi no programa do I Festival Internacional de Música Contemporânea de Vanguarda, em Osaka.” Dez anos depois, mais precisamente em 30 de janeiro de 1973, a crítica Maria Abreu, na sua coluna no jornal Última Hora, do Rio de Janeiro, baseada em informações do pianista  Roberto Szidon sobre as atividades de Vinholes no Japão e na Europa, escreveu: “E aqui no Brasil, ao que parece, ninguém sabe quem é este compositor de 42 anos, talvez tão importante quanto Manabu Mabe.”

Em fevereiro de 1964, no Hall Renascença, em Seul, Coréia, os músicos da Orquestra Sinfônica de Seul regidos por Mon Bok Kim, com transmissão ao vivo pela Rádio HLKJ, usaram os cartões da Instrução 61. A primeira vez que com ela se fez música aleatória no Brasil foi em 15 de setembro de 1974, no X Festival Música Nova de Santos, pelo Madrigal Ars Viva dirigido por Roberto Martins, utilizando vozes e instrumentos.

 

 

 

Músicos da Orquestra Sinfônica de Seul,
utilizando a Instrução 61, em transmissão pela HLKJ.
L. C. Vinholes no canto esquerdo superior.

 

 

Em artigo publicado pelo jornal Tribuna, de 14 de setembro de 1975, o compositor Gilberto Mendes, comentando as obras apresentadas no XI Festival Música Nova de Santos escreve: “A terceira música do programa tem importância histórica dentro da música brasileira. É Instrução 61, do brasileiro Luiz Carlos Vinholes, introdutor da música aleatória em nosso país”. Cinco anos depois, no artigo Uma História da Música com Vários Pecados, publicado no jornal Folha de São Paulo, o compositor João Marcos Coelho faz uma série de criticas à História da Música no Brasil, de Vasco Mariz, onde se lê: “E Gilberto Mendes não é o pioneiro da música aleatória, como quer Vasco Mariz, mas sim Luiz Carlos Vinholes, autor, em 1961, de Instruções 61, a primeira peça aleatória brasileira[i]. Vinholes, aliás, sequer é citado nesta ‘história’, assim como Armando de Albuquerque e Jocy de Oliveira.”

 Nas últimas décadas, a Instrução 61 tem sido freqüentemente utilizada por diferentes grupos e formações instrumentais, inclusive pelo Quarteto de Cordas da UnB, formado por Moysés Jacob Mandel, Valeska Hadelich de Ferreira (violinos), Johann Georg Sheuermann (viola) e Antonio de Pádua Guerra Vicente (violoncelo); pelo Grupo Experimental Musical da UnB (GEMUnB) com participação de Bohumil Med, Fernando Vasques, Maria Rute Cavalcanti, Maringa Lisboa, Vaclav Vinecky, Maria Helena da Costa, Wilson Trajano Filho e Jorge Antunes (regência), utilizando oboé, trompa, viola, piano e 4 colaboradores; pelo Núcleo Música Nova de Montevidéu; na oficina de leitura dirigida pelo professor Mário Maia, na Semana Acadêmica do Conservatório de Música de Pelotas, da UFPel; e em outros eventos, tais como: II Encontro Nacional de Compositores em Brasília, patrocinado pelo Instituto Nacional de Música-Funart-MEC-Fundação do Distrito Federal; Música na XV Bienal Internacional de São Paulo; Festival de Inverno de Campos de Jordão; e XI Festival Música Nova de Santos.

 A Instrução 62, criada por Vinholes logo após a Instrução 61, teve seu primeiro uso em Tokyo, em 30 de março de 1962, também por Tomohisa Nakajima; e, no Brasil, pelo pianista Paulo Affonso de Moura Ferreira tendo como colaboradora Ingrid Madson; e por Gilberto Mendes, ao piano, no XII Festival Música Nova de Santos, em 30 de março e 10 de setembro de 1976, respectivamente.

Em 1979, apresentou uma nova idéia criar música aleatória. Para homenagear as crianças no seu Ano Internacional, Vinholes criou a Peça/pessa para fazer “xi”/”psiu”, para bocas, dedicada ao Madrigal Ars Viva. Foi por este utilizada pela primeira vez em 28 de outubro de 1979, durante a Semana de Canto Coral, em São Paulo. Foi usada novamente em 21 de junho de 1980, no concerto de abertura do V Salão de Arte de Ribeirão Preto, pelo Madrigal Revivis regido por Lutero Rodrigues; em 26 de julho deste mesmo ano, no Festival de Inverno em Campos do Jordão, pelo mesmo Madrigal Ars Viva; em 7 de novembro de 1983, na V Bienal de Música Brasileira Contemporânea, no Rio de Janeiro, pelo Coro Infantil do Teatro Municipal, dirigido por Elza Lakschevitz; e, em 24 de novembro de 2000, pelo professor Mário Maia na referida Semana Acadêmica.

Para melhor entender a obra de Vinholes, vale a pena lembrar o que Gilberto Mendes publicou a seu respeito na Tribuna de 30 de junho de 1976: “Vinholes sempre foi um solitário, indiferente às modas, às ondas nacionalistas – atualmente parece que estamos entrando numa razão porque sempre se manteve na sua, cuidando do desenvolvimento de sua linguagem, sua pesquisa. É um herdeiro espiritual do pensamento musical de Anton Webern, o grande mestre da Escola de Viena. Trabalha sua música com uma bem pensada economia de meios. E trabalha pouco, só quando reconhece que vale a pena comunica o que concebe. Tal como Webern. Por isso já o chamei de compositor bissexto.”

 

 

 

[i] A Instrução 61, assim como a Instrução 62 Não são peças/obras aleatórias, mas sim bulas, instruções que, usadas, resultam em músicas de caráter aleatório.

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