----- O maior e mais importante estado democrático da América do Sul deve rondar actualmente cerca de 140 milhões de lusofalantes distribuídos por 8.511.965 Km2, um autêntico colosso enformado por 502 anos de cultura portuguesa em permanente transgressão libertária e persistente procura de identidade própria. Venham os cronistas do rei donde vierem, a aspiração é legítima: os brasileiros dão metade de presença viva à totalidade da lusofonia que se espalha pelos quatro cantos do globo.
----- Nas mais importantes cidades do Brasil cabe Lisboa no bolso onde os dedos médio e indicador colocavam o lenço de enfeite, pormenor fidalgo em derradeira e definitiva extinção, tal e qual este grande país assume natural e alegremente o desenlace histórico com Portugal, que não significa hoje factualmente mais do que uma parda nuvenzinha a diluir-se.
----- Políticamente falta apenas aplicar uma medidazinha proclamativa para que daqui a 100 anos, digamos, a polémica dialéctica sobre a língua falada e escrita cessasse cerce. Diria então desde já o presidente da república em exercício: doravante a língua usada designar-se-à de brasileira.
----- Não haveria pois a necessidade de mais acordos linguísticos e estultas medidas gramaticais que apenas geram controvérsia, confusão e pânico intelectual entre aqueles que ora pretendem dominar o português correctamente e os que se motivam na deriva linguística ao sabor da amálgama vocabular do povo brasileiro.
----- Quem bem nos olhos e ouvidos sinta a musicalidade linguística do Brasil, pressente que as represas dominantes se romperam já demasiado e a corrente entrou em cascata até que encontre percurso largo e sereno. É imparável e talvez a única forma de assegurar a lusofonia por mais quinhentos anos.
----- Lembra-me dos que davam a vida, e muitos deram, por Angola, Moçambique e demais países lusófonos, e hoje vão sim dá-la ao serviço de estranhos interesses estrangeiros. Camões bem avisou: "Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades"! Em Lisboa, poucos ainda o vêem, mas o rei vai nu e difícilmente arranjará roupa condigna para tapar o que pôs à mostra.
----- Em termos objectivos que só a mim concernem aritméticamente, tanto se me dá. Todavia, espiritualmente e enquanto estiver vivo, confranjo-me e quem me dera de alma que assim não fosse e, em memorável castigo, este texto não passasse dum agonizante embestamento!
----------------- Torre da Guia ------------------
