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Cartas-->MÃE..., -- 10/05/2003 - 00:54 (Agostinho M. da Costa) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Não esqueço quando no céu, antes que você me trouxesse para o nosso planeta, o quanto sofria ao ver outros anjinhos serem chamados por seus pais, enquanto eu ansioso, esperava você e papai se acertarem no casamento para me trazer.

Mãe, o Anjo da guarda, vivia chateado comigo, porque enchia o saco dele. Será que Anjo tem saco, mãe? Acho que os anjos não têm sexo!

Mãe meu primeiro susto foi quando desci nas asas dos anjos do céu para ser colocado em seu ventre. Você não tinha percebido quando começou o sintoma da gravidez: Vômitos e desejos! Você não tinha nenhuma experiência e nem o papai. Um dia ele levou você ao médico, e, depois de examinada veio aquela explosão de alegria quando o doutor deu a noticia da minha chegada. Mãe o pai levou um susto e eu também!

Mas logo tive a proteção das suas mãos acariciando-me! Por que papai demorou, a saber, que eu estava ali com você? Ele não foi avisado?

Mas valeu quando ele soube, puxou você para dançar e girou muito. Mãe! Fiquei tonto com tanta alegria, estampada nos olhos de vocês. Onde estava não dava para ver, mas esse contentamento iluminou a bolsa em que eu estava. Sempre que havia alegria, a bolsa recebia uma luminosidade sem igual. Mas quando você chorava de dor, lembro que tudo ficava escuro. Tinha medo, sabe mãezinha?

Lembra mãe, que papai disse: - Não quero que aconteça nada com minha mulher, doutor. Não esqueço mãe, que você era mais importante que eu. Por quê? Senti ciúmes de você pela primeira vez, mãe!

Fiquei muito triste, por que você me fez seu troféu, e ele tentava alisar sua barriga para eu ficar quieto. Ele te amava muito, não era mãe?

Fomos, para casa, e ainda nada entendia, cercado por paredes de sangue, e muita água, ligado por um cordão umbilical, que me alimentava. Mas sentia que havia muita alegria naquela pequena comunidade, cercada de ótimos vizinhos, que correram quando souberam da minha chegada.

Não dei bola para ninguém, nem um chute! Ria da fisionomia da vovó e do vovô que queriam sentir-me dentro de você. Enciumado eu dormia!

Mãe! Certo dia, cansado de ficar quietinho e só com você, resolvi acordar. Lembra dos meus primeiros chutes? Não esqueço quando diziam que seria jogador de Futebol. Não passei de um frangueiro goleiro!

Você toda boba, fazia questão que todos sentissem aqueles chutes.Íamos sempre ao médico, e ele dizia estar tudo bem comigo. Não víamos a hora de eu nascer. Lembra? Mãe, coitado do papai que fazia suas vontades nos desejos loucos. Lembra que queria suco de jabuticaba, quando não era época? Sorte que o vovô sempre guardava geléia das frutas, nos vidrinhos que depois eu destruí. Por que eu era levado, mãe?

Mas aquela da jaca foi demais. Não tinha jaca madura e você comeu uma que mal nascia, verdinha, em plena madrugada chuvosa, papai subiu na jaqueira. Um bobão que fazia suas vontades.

Coitado do pai, um santo homem, mas mal entendido. Só porque ele era namorador ou como dizem uma galinha, o apelido que fofocavam, suas amigas interessadas nele.

Gostava mãe quando você brigava com ele, e logo que ele saia você sussurrava: Eu te amo, marido safado.

Não entendia mãe, se você o amava, por que brigava? Era difícil entender, mãe, já que nada via de onde estava.

Mãe, posso garantir que ele lhe amava, porque ao colocar sua mão em sua barriga ele dizia para mim que lhe amava. Você não ouvia, mas eu sentia no calor daquelas mãos, alisando sua barriga e me amando também.

Mãe! Adorava quando o velho vinha para casa depois das serestas com Silvio Caldas e Ciro Monteiro, e adentrava ao quarto nas pontas dos pés. Você fingia dormir e quando ele sorrateiro deitava, você o surpreendia, e ele dava mil desculpas, entre elas o trabalho. Será que papai era namorador mesmo, mamãe?

Eu acho que não mãe. Ele era ladino, quando apagava a luz do abajur, então eu ficava quietinho na bolsa. Vocês não paravam de sacolejar. Por que papai jogava o leite fora mamãe?

Não entendo seu sofrimento antes que eu nascesse? Eu era o culpado, mãe?

Mas até naquela hora do nascimento para você foi um sufoco! Lembro que algo enrolou em minha garganta e fiquei sufocado.

E, então a parteira desesperada pela falta do médico que tinha viajado. Não sabia o que fazer. Você orava e ao mesmo tempo chorava, mas infelizmente nada poderiam fazer por mim. Meu coração parou e você percebeu pediu ao papai que ele comprasse o caixão mais bonito da cidade para mim.

Poxa mãe, eu queria tanto viver, que corri aos céus e pedi ao anjo de plantão que desse uma mãozinha. Disse-lhe que minha volta não seria boa para eles, já que iria infernizar o recinto dos recém nascidos. Lembro da choradeira do lugar! Ninguém me queria de volta. Como eu era irrequieto, ele mexeu os pauzinhos junto aos seus superiores e me devolveu a vida.

Retornei para casa e vi meu corpo sendo enrolado em uma roupa de pagão, com o crucifixo que você usava no meu peito.

Agora lembro que papai ia vestir à veste de padre quando resolveu fugir do seminário para casar com você, uma menina de quatorze anos.

Dei um susto em vocês quando comecei a mexer, e disseram ser milagre como outros que se seguiram.

Olha mãe, foram tantos em minha vida. Será que Deus e Nossa Senhora são meus amigos ou os meninos do céu não me queriam?

Mãe que vida sofrida você levava. Coitado do pai que ganhava muito pouco. Sempre com os trocadinhos no bolso. Sorte o vovô e a vovó com sua lavoura e plantas tinham, sempre alimentos para nós.

Mãe! Lembro, quando eu fui expulso do colégio. Você apelou para todos os santos. Papai não admitia o que eu fazia. Sempre me pegava de jeito. Mas nunca vi ódio nos olhos dele. Acho que ele chorava quando me batia. Nunca senti dor, mesmo quando ele me acertava com força.

Mãe você trabalhava um bocado! Costurava para fora, lavava e passava. Lembro quando levava suas roupas para entregar na Marinha. Você nunca saia. Ficava nos esperando, sentada na sala, com um jornal. Sabe que um dia por sorte você não se feriu?

Aquele dia quando cheguei por volta das 4:00 horas da manhã você estava com a cabeça deitada em cima dos óculos. Por sorte naquele dia não bebi nada. Deu para tirar os óculos e acorda-la.

Mãe! Cresci e veios as amizades, mulheres, orgias. Esqueci de você. Sai de casa porque não precisava mais dos seus carinhos.

Estudei tinha como me virar. Minhas amizades fizeram esquecer de você e do paizão. Depois soube da sua doença no estomago. Você mandava recados que estava com saudades, mas não tinha tempo para você. Estava ganhando bem, e era o dono do mundo. Não esqueço mãe que tinha vontade de dizer que te amava, mas não tinha coragem de dizer. Um dia ouvi você dizer para papai que adoraria ouvir essas palavras da minha boca. Mas eu não podia dizer porque vocês pegavam no meu pé. Exigiram muito para que estudasse, e, com certeza eu estudei para me livrar da família. Queria ser livre!

Não esqueço mãe de ser obrigado a escovar os dentes, esfregar a orelha. Depois de tanto trabalho e zanga, você chegava e me colocava no colo, e beijava. Eu cresci e você não notava. Era sempre o mesmo tesouro para você.

Você ficou dois anos de idas e vindas aos Hospitais, e, eu nunca tive coragem de visitá-la. Lembro que argumentava que não suportava Hospitais pelo cheiro de éter. Você compreendia e pedia paciência ao pai, que vivia reclamando minha falta.

Um dia chegou o recado que deveria correr para o Hospital que você estava muito mal e queria que eu cantasse uma música para você dormir.

Mãe lembra que você dizia que eu seria cantor? Quantas vezes; peguei você chorando ao me ouvir cantar.

Um dia levaram você para casa, porque eu não suportava Hospitais.Não tinha como não atender sua vontade e corri para casa, e cantei o "cai-cai balão, ciranda cirandinha", e outras.

Mas com o "Boi da cara preta do Dorival Caimmy", senti umas lágrimas

jorrar dos seus olhos. Mas consegui fazer você dormir.

Lembrei então do show no Teatro Municipal de Niterói patrocinado pelas Escolas, quando recebi o primeiro terno, adquirido por você as escondidas do pai, que não gostava da vida libertina, que os artistas levavam.

Mãe aquele dia das mães, foi minha última vez que cantei. Os organizadores querendo fazer uma homenagem surpresa para mim, colocaram você na primeira fila.

Comecei a cantar e quando há vi, não tive como segurar o tremor. Minhas pernas tremiam e o ódio. Sabia que papai ficaria brabo com você, por ter ido ao espetáculo. Você ia sofrer! Mas não adiantou nada porque acabei agredindo um padre responsável por sua ida. Que vexame mãe? O homem só queria lhe homenagear.

Não vi você depois que sai do palco chorando. Deixei o microfone no chão, correndo para o camarim. Mas sei que o pai ficou zangado comigo. Foi o meu pior dia até então.. Adorava cantar e nunca mais poderia enfrentar meus amigos e colegas.

O tempo passou e poucos dias, depois de eu cantar para você, obtivemos informação do seu estado critico. Teria que ir ao Hospital, porque você estava com aneurisma abdominal e pressão alta. Não reagia aos tratamentos e não iria resistir muito!

Preparei minha despedida. Escrevi algo para dizer e não esquecer. Acho que demorei muito escrevendo. Corri para o Hospital, mas ao chegar há porta do quarto vi seu último sorriso. Não tive tempo de pedir perdão pela minha omissão em estar com você quando mais precisava. Mas o que me deixou triste mãe, foi não dizer o que você gostaria de ouvir. Mas mãe no meu bilhete eu escrevi e lhe diria que sempre AMEI VOCÊ E PAPAI.

Como está chegando mais um dia em que as Rainhas dos Lares serão homenageadas. Eu preciso que saiba que preciso livrar dessa culpa da ingratidão, que dizima minha alma. Ao lembrar o que fiz com você, mamãe. Mas cumprir a risca seus ensinamentos.

Que pena mãe, ver tantas crianças sem famílias, e que as mães precisam trabalhar, para sustentar a casa, porque o marido está desempregado. E as mães solteiras ou abandonadas, mãe? Deve ser horrível ser um filho sem pai ou mãe, para conversar. Agora mãezinha; não entendo porque os filhos matam seus pais para ficarem com a herança, para poder comprar drogas. Será que não são inteligentes para saber que os pais são os melhores tesouros que existe na vida? Mãe! Acho a maior tristeza quando tomo conhecimento que abandonaram os pais em asilos em troca da pensão. Mas duro mesmo, mãe, é quando a uma genitora entrega um filho para a policia, para que ele não morra.

Mamãe, onde estiver perdoa-me, e saiba ao não ter coragem de dizer o que você queria ouvir na época; sentia receio de alguém que pudesse ter conhecimento do meu gesto, que tinha virado o fio, e que eu era afeminado.

Mas agora não me importo! Chega de manter esse amor escondido. Diga aos anjinhos ai do céu que um dia vou estar de volta, e reunidos sem receio ao lado de papai, direi bem alto o quanto amo minha Mãe e meu PAI.

Mãe! Sei que você não vê defeitos em mim e eu sou o melhor em tudo,como todas as mães que amam seus filhos, mas tenho meus defeitos. Promete não ficar triste?

Mãe, queria tanto beijar uma mãe aqui na terra, mesmo aquelas sonhadoras, não conseguiram ter filhos, ou na sublimação, adotam crianças abandonada; então resolvi escrever, para alertar algum filho ou filha, o tesouro que eles teen, e ao beijar sua mãe todos os dias (não só no dia que são homenageadas) reconheçam o tesouro que eles têm;, mesmo quando ela está suja de ovo, ou esfregando um chão, mendigando um pão para levar para sustentar os rebentos pequenos ou já homens, que sonham, viver o sonho que sua MÃE não viveu.

Mãe de todas as cores perdoe seus filhos se eles lhe esqueceram. Um dia eles vão colocar a mão na consciência e vão dizer: MÃE EU AMO VOCÊ.

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