Insuportável... O Reinaldo não podia mais com aquilo... Santinhos todos da terra... Sempre que se preparava para a festa da carne com a Alice, lá vinha a mosca, volteante, zunindo, pousa, levanta, pousa, ora no calvo aeroporto do aflitinho das partes em inchaço, ora no pescoço, nas orelhas, no nariz. Pasme-se até, quando uma dada vez se preparava para montar na Alice, a díptera, zás, aterrou a pique numa das faces anais.
Bate à direita, bate à esquerda, bate que bate, a diabolizante mosca escapava-se sucessivamente. O Reinaldo batia ali, batia acolá, e assim ia dando cabo de peças de estimação que lhe adornavam a casa, algumas de valor estimativo que, ao destruirem-se, queimavam-lhe a alma. Aquilo não cessava e logo nos momentos cruciais em que a Alice se dava e punha à mão de semear.
Insecticidas, mata-ratos e outras mezinhas para liquidar parasitas, não davam resultado algum, meses, anos a fio, a díptera aparecia sempre na hora "H". O Reinaldo já não se lembrava de se vir nem de se ir. Sequer relacionava que era o raio da mosca lhe provocava todos aqueles enganos que tinha no emprego e as más relações que ultimamente estavam a recair entre si e os amigos.
Um dia, após preparar a Alice com o fim de esvaziar os dois pensamentos, fechou tudo quanto havia para fechar no seu quarto, muniu-se de uma garrafa com gazolina e, de olhos em brilho além do sol, enquanto massajava a Alice nas costas, aguardou ansiosamente pela chegada da mosca. E ei-la, qual caça alemão a tornear à volta da cena que se preparava.
O Reinaldo não hesitou. Atirou a garrafa contra uma das paredes, a gasolina espalhou-se e acendeu de imediato o isqueiro, o que num ápice colocou o quarto em chamas. O enlouquecido homem correu todo nu para fora do quarto, fechou a porta e... Esqueceu-se da Alice. Um minuto depois, quando se lembrou da mulher, a estupefacção estarreceu-o. Não havia absolutamente nada a fazer.
Mais tarde, depois de amargurados dias de prisão preventiva, em pleno tribunal, no dia do julgamento, o juiz aludiu:
- Então... Senhor Reinaldo, foi mesmo por causa da díptera?!...
- Da díptera?!... Não, não senhor doutor... Por causa da mosca, da mosca!...
- Sim... Sim... Por causa da mosca...
- Foi senhor doutor... Não calculei as horríveis consequências...
- Pois... Pois... Agora vai 20 anos para a cadeia. Bem... Se tiver juízo e se deixar de moscas, cumpre metade da setença e fica livre...
E assim foi. O Reinaldo cumpriu 10 anos de cadeia. Já em liberdade, acidentalmente descobriu que era a mulher que caçava moscas, prendi-as numa caixa três e quatro dias sem os bichos comerem, e sempre que sentia que o Reinaldo queria fazer sexo, soltava uma de cada vez mesmo em cima da oportunidade.
O Reinaldo, hoje, ainda é vivo. Só que não tomou espécie de juízo algum e está ainda muito pior do que anteriormente. Agora é ele que anda armado em díptero internético, modalidade assaz muito em voga no Brasil, e não cessa de voltear, de pousar, de levantar , enfim de "dipterar" quanto pode na Usina de Letras... Quiçá para se vingar do que a mulher lhe fez com o raio das dípteras....
Coitado... Coitado... E coitadinha da Alice também... Né?!
Torre da Guia = Porto
PS = Este texto é mesmo uma carta... Uma carta que dirijo às dípteras e aos dípteros "reinaldantes". |