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Cartas-->DESARMAMENTO INÚTIL -- 29/07/2005 - 16:50 (JOÃO DE FREITAS) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

"Conforme anunciado na semana passada, o OTJ, até 23 de outubro, vai publicar matérias acerca do referendo do comércio de armas. Nesta edição, democraticamente, abrimos espaço para a visão de quem se posiciona a favor do comércio de armas. O autor do artigo é o ex-governador de São Paulo e deputado federal Luiz Antônio Fleury Filho. Os servidores também são convocados a se manifestarem. Envie sua opinião sobre este texto e sobre o tema em si para o endereço brunec@sitraemg.org.br (assunto: Referendo das Armas). Nas próximas edições, publicaremos a síntese das intervenções dos servidores.

Opinião: Igualdade no debate

Há meses, o Brasil assiste a discussões sobre a importância da realização do referendo sobre a proibição da venda de armas e munições, como se fosse a mais urgente providência a ser adotada para resolver a violência que amedronta e infelicita o nosso País. Na verdade, falar em discussões é mera figura de linguagem, pois o que se vê é um avassalador monólogo a favor da realização da consulta popular, já que os meios de comunicação rara e episodicamente abrem espaço para os que, contrariando a onda, ousam defender a sua inutilidade.

Não pretendo, a esta altura, reafirmar as razões que me levaram, desde o início, a me posicionar contra o chamado Estatuto do Desarmamento. Adotada em outros países, tal política se mostrou ineficaz, não levando a significativos resultados no combate à violência. Cabe-me, agora, alertar para a nova campanha, insidiosa e falsa, que pode levar os brasileiros a engano, na hora decisiva do voto.

Afinal, qual é o objetivo do referendo?

Se nos basearmos nos pronunciamentos feitos a respeito do assunto, poderíamos acreditar que o sucesso do Estatuto do Desarmamento depende da resposta positiva à consulta popular. FALSO. Uma coisa não depende da outra. As regras do estatuto já estão em vigor, na sua inteireza, e não dependem do referendo para se manterem eficazes. Mentem, pois, aqueles que defendem a realização da consulta popular sob tal argumento, da mesma forma que mentiam aqueles que, durante a tramitação do Estatuto do Desarmamento, diziam que a sua aplicação levaria à diminuição dos crimes violentos.

A mentira, muitas vezes repetida, pode ser encarada como uma verdade. É o que acontece agora, a respeito do tema, em vários aspectos. Fala-se, por exemplo, no grande sucesso do desarmamento, já que quase 400.000 armas teriam sido recolhidas e destruídas pelas autoridades. Ora, no auge da discussão sobre o estatuto, algumas ONGs falavam na existência de 20 milhões de armas ilegais no Brasil (depois, falou-se em 8 milhões, e, após a aprovação da lei, em 5 milhões). A simples comparação numérica mostra que a campanha foi um fracasso.

Agora, ao invés de atacar de frente os problemas da segurança, vem aí mais uma farsa, a do referendo. Vamos responder a uma única pergunta: DEVE SER PROIBIDO O COMÉRCIO DE ARMAS E MUNIÇÕES NO BRASIL? Responder sim ou não, em matéria de combate à violência, não vai mudar absolutamente nada.

No ano passado, foram vendidas para civis, no Brasil, cerca de 1.300 armas. Note-se que, para adquirir uma arma, a partir do estatuto, o interessado deve atender inúmeras exigências, o que dificulta, em muito, a transação. Se calcularmos que, em média, cada arma tenha custado R$ 1.000,00, o total das vendas teria alcançado R$ 1.300.000,00. Para evitar que tais vendas aconteçam, o governo federal vai gastar a bagatela de R$ 600.000.000,00. A desproporção é absurda e inaceitável. Principalmente por não contribuir em nada para a redução da criminalidade. Enquanto isso, há pessoas que ainda não receberam a indenização que lhes foi prometida em troca da entrega de suas armas. E o que é pior: segundo uma revista semanal, dois dos já insuficientes três postos da Polícia Federal, situados na fronteira com a Colômbia, estão sendo desativados, por falta de recursos para mantê-los. Falta dinheiro para combater o contrabando de armas e o tráfico de drogas, mas existem recursos para realizar um referendo inútil e sem propósito.

Há outras questões ainda não resolvidas, a começar da forma e do financiamento da campanha de esclarecimento que, necessariamente, deve anteceder a realização do referendo. Quem arcará com as despesas de produção e veiculação das peças publicitárias a favor e contra a proibição? E os meios de comunicação, hoje em sua maioria em campanha aberta pela proibição, poderão continuar a influenciar a população, desequilibrando o debate e impedindo que o eleitor possa tomar sua decisão de forma livre e consciente? E os governos, poderão continuar usando a máquina, para ver triunfar uma idéia que lhes agrada, apenas para satisfazer interesses que ainda não vieram à luz? E as ONGs, muitas delas irrigadas com verbas do exterior, continuarão com sua pregação livremente, sem restrições, influenciando pessoas com seus argumentos muitas vezes intelectualmente desonestos e suas estatísticas tantas vezes manipuladas? Se tais fatos ocorrerem, o resultado do referendo estará irremediavelmente comprometido.

Se aprovada a proibição, como ficará a situação dos que, honestamente, cumpriram a lei e registraram suas armas, para tê-las em casa, ou, mais especificamente, aqueles que residem em fazendas afastadas de cidades, em regiões de fronteira ou onde existam animais selvagens? Proibido o comércio de munições, suas armas não poderão ser utilizadas, impedindo-os de defender suas famílias, a não ser que passem a comprar munição no comércio ilegal, que, sem qualquer dúvida, crescerá.

Não sou contra a consulta popular. Entendo, no entanto, que ela deveria ser feita cinco anos depois da vigência do Estatuto do Desarmamento, para que se pudesse avaliar cientificamente os resultados obtidos com a aplicação da lei. Realizar o referendo agora, sem maiores informações, é, no mínimo, temerário e precipitado.

Marcada a data do referendo, é necessário que o debate seja equilibrado e sem preconceitos. Denominar aqueles, como eu, que não comungam da idéia do desarmamento, de integrantes da “bancada da bala” já é manifestação de intolerância; afinal, Adolf Hitler, Idi Amin Dada e o Khmer Vermelho (dentre outros) defenderam o desarmamento civil de seus povos, e nem por isso se poderia chamar as ONGs e os defensores do desarmamento de nazistas, radicais ou de ditadores. Não se pode generalizar. Queremos respeito pelas idéias, e, acima de tudo, igualdade no debate".
Luiz Antônio Fleury Filho
Ex-governador de São Paulo e deputado federal (PTB/SP)

Publicado no Jornao O Trabalhador Judiciário.




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