Entre solavancos friorentos e carícias solarengas o Natal de 2007 depara-se-me como os 16 eventos antecedentes: tem nome que entendo de fio a pavio, mas, no meu caso, faltar-lhe-à o conteúdo real, algo que nunca mais poderei lograr.
Após ter experimentado algumas natalícias panaceias, há 6 anos a esta parte, decidi reduzir-me ao meu específico e autêntico Natal, que é de resto um tranquílo espaço de tempo que tenho agradavelmente fruído na excelente companhia de meu cão, de minhas dilectas recordações e saudosos afectos.
Hoje, após o jantar, na apresentação do (des)concurso televisivo na RTP1, ouvi o Malato - beaucoup gai - dizer tal e qual: « - Como não há nada mais triste do que passar o Natal sozinho, chamo os meus concorrentes...».
Pelo menos eu, tenho a certeza absoluta que o Malato, na maior parte das vezes que fala, presumindo-se um alardeante poço de saberes, não sabe deveras o que diz e sequer faz ideia da lástima triste que alegremente produz.
Para este Natal, pois, que se avizinha a galope e que passarei sozinho em voluntarioso recolhimento - de nada careço para distrair a lucidez - o meu amigo Nelson Duarte, conhecedor de alguns dos meus pendores favoritos, ofereceu-me dois lençolinhos brancos e uma robusta manta escocesa. Terei assim óbvio trenó, assaz quentinho, para subir e descer a nevada montanha do meu 68º. Natal.
Também, o meu recente amigo Manuel Morais, um setentão que eu nomearia sem hesitar ministro da alegria sádia que é preciso semear, presenteou-me com um colete anti-bala até às orelhas, que desde logo meti a uso - e um lindíssimo guiso para me alertar das nocturnas vertigens onde afogo minhas frustações e quejandos arrepios íntimos.
Entretanto, por que não almejo ambiguamente paz nem guerra, confessando-me sem mais pachorra para sentir no meu cérebro o desejo de emitir os vocábulos «bom» e «feliz», termos aos montes que cada vez mais minguam ao traduzir-se em gestos, limito-me à vulgar-invulgar expressão do sentimento-menino que ainda se aconchega dentro de mim: - Dlim-dlão!...
Porto, 21 de Dezembro de 2007
António Torre da Guia |