Determinadas coisas parecem fazer parte da nossa essência, correr nas nossas veias, fazer parte do ar que respiramos.
Creio que “escrever” é uma dessas coisas que faz parte de mim. Desde criança eu sinto isso. Talvez por isso, mesmo tendo vivido a infância numa época em que não havia pré-escola, que as crianças só se sentavam nos bancos escolares após os sete anos de idade e sendo filha de pais que sequer concluíram o curso primário (no tempo deles tudo era ainda muito mais difícil), não dei descanso a eles enquanto não me ensinaram a ler e escrever quando tinha apenas quatro anos de idade.
Desde então, portanto há bem mais de meio século, a caneta foi sempre o instrumento que me acompanhou diuturnamente e não havia pedaço de papel que passasse por mim sem que ali eu deixasse a minha marca, os meus pensamentos, a minha inspiração do momento.
Talvez também por isso vivesse uma guerra interior na época do colégio, pois ao mesmo tempo em que era amante da matemática, tendo ganhado inúmeros concursos dos quais participei graças à coleção de notas dez que amealhei ao longo do curso e sendo professora do Clube de Matemática que havia sido idealizado e montado pelo tão querido professor Nilton, eu não conseguia me imaginar viver o resto da vida fazendo cálculos, abandonando a literatura que eu tanto amava. Era como se eu fosse casada com dois homens e tivesse que escolher apenas um para viver sob o mesmo teto!
Decidi, então, abraçar os números num primeiro momento, tendo como projeto abraçar as letras logo em seguida.
Nem preciso dizer que o professor de matemática adorou a minha decisão, enquanto que o de português e literatura, professor Ismael Rielli, revelou-se imensamente decepcionado com a minha escolha, declarando textualmente: “fique então, com os seus números, que eu continuarei com as minhas letras”. Esse ciúme me deixou até com uma ponta de vaidade, na época, pois eu conhecia bem o tamanho do carinho que ele tinha por mim e que essa frase não passara de um desabafo de quem tanto apostara em mim.
E foi assim que após concluir o curso colegial fui atrás de um diploma de Contabilidade e depois de um de Economia e de Administração de Empresas, profissões que eu imaginava terem maior campo de atuação profissional, sem, entretanto, jamais deixar de escrever minhas bobagens nos papéis que se apresentavam em branco ante os meus olhos.
Cumprira, assim, a primeira etapa dos meus projetos. Chegara, então, o momento da minha satisfação pessoal. E lá fui eu, mais uma vez, prestar vestibular e sentar nos bancos de uma Faculdade de Direito, sem imaginar que mais do que me realizar pessoalmente, eu me realizaria, em decorrência desse curso, profissionalmente também.
E mais do que nunca passei a escrever dia e noite. Ora profissionalmente (quase que tempo integral), ora rabiscando os meus pensamentos em verso e prosa.
Mais alguns anos se passaram e chegou a era da informática e a caneta foi perdendo espaço para o teclado que passou a tomar a maior parte do meu tempo. E, de repente, a grande descoberta de salvar tudo que fosse escrito e da existência de sites (eu mal sabia o que era isso) que poderiam guardar o que eu escrevia para mim, inclusive divulgando a fim de que pudesse ser lido por outras pessoas.
E em pouco tempo me surpreendi com as mensagens recebidas que enchiam a minha caixa de correio, os convites para publicar em outros sites, os amigos que foram nascendo em decorrência do que eu escrevia e publicava.
Houve épocas em que escrever já era automático, a inspiração chegava a todo vapor e, bem ou mal, bom ou ruim, os meus textos em prosa e as minhas poesias passaram a fazer parte da vida de muitos leitores, muitos dos quais sentiam falta dos mesmos quando, por qualquer motivo, eu ficava um ou outro dia sem publicar.
E, escrever, acho que é como pipoca: basta uma e já não sabemos quando, nem como parar.
Mas a vida da gente é composta de fases e quem, como eu, não é um verdadeiro escritor e tampouco poeta, algumas fases se colocam além da inspiração e até da vontade de escrever. Sem contar a luta que muitas vezes travamos contra o tempo que parece não nos permitir aprendermos a dividi-lo melhor a fim de que possamos fazer sempre um pouco mais, incluindo o que fazemos para nós mesmos, para nossa realização, lazer ou até vaidade.
Por algumas razões, há tempo que não escrevo. E ainda que alguém julgue que não é tanto tempo assim, eu relembro que “escrever” está minha essência, no meu sangue e, portanto, estou sentindo falta disso.
E já que não recebi alguma inspiração melhor (na verdade nunca sabemos o que é melhor), sentei aqui hoje, diante deste teclado e deste monitor, para simplesmente gravar o que estava pensando e, abusando da boa vontade dos meus leitores, registrar mais este pedacinho de mim.