Brasília, 19 de janeiro de 2010
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Minhas queridas amigas
Meus queridos amigos
A visita incômoda
Não é nada fácil superar uma fase nada alvissareira. Os médicos constataram, há cerca de dois meses, que um hóspede, não desejado por mim, um cancerzinho, sorrateiramente, invadiu meu estômago e pretendia instalar-se definitivamente em meu esqueleto recheado de músculos e órgãos vitais, sem contar minha alma que tanto prezo, e transformá-lo num covil de bandidos agressores, covardes e impiedosos.
Na verdade, não lhe solicitei a presença nem lhe fiz qualquer convite. Além deste malfadado inimigo, também uma lesão no reto foi detectada para desconforto de meu pobre organismo. Com certeza, pretendiam aniquilá-lo, de vez, ou devorá-lo, sem dó nem piedade; ou então transformá-lo num monte de carniça e, sabe lá Deus, o que mais!
Recebi de presente um choque, com certeza, de um milhão de watts ou mais, que me causou inusitado susto (ponha susto nisto!), que abala fortes e fracos, na mesma intensidade. Não convidei estes intrusos inimigos. Marotamente, invadiram meu domínio privado. Acomodaram-se em meu pobre corpo. Não obstante, não lhes dou trégua. Não me deixo vencer por tão pouco!
É verdade que, até há pouco (não tenho vergonha de dizê-lo), tinha fortes crises de choro e incontido desespero. Chorava copiosamente. Agora, não mais. É doloroso, sem dúvida. Não há palavras, nem imagens que descrevam este sofrimento, esta provação. O ser humano, contudo, tem energia bastante para derrotar esses intrometidos visíveis e invisíveis.
Tal qual da primeira vez, nos idos de junho de 2004, ao tomar conhecimento do câncer na próstata, dominei este hostil e sanguinário metediço, que me fez produzir a crônica “A provação ou o sofrimento”. Desta vez, certamente, será “A provação II”. Não é fácil! A luta é desproporcional. Literalmente, será a guerra total. É uma batalha descomunal, que se transformará num banquete sem igual, de significativa vitória sobre o inimigo cruel.
Afinal, o ser humano carrega dentro de si a energia vital e divina, mas poucos a utilizam ou sabem utilizá-la devidamente. Espero poder, também desta vez, superar e suplantar, para sempre, este monstro pavoroso e maldito e vencer esta peleja ignóbil, porque há sempre a esperança, a vontade e a alegria de viver!
Pelo que sei, da penca de cansativos exames feitos e dos procedimentos já realizados, para meu conforto, o câncer no estômago é periférico e inicial. Portanto, curável, por meio da mucosectomia. A lesão no reto não é cancerosa, segundo os notáveis médicos, que me assistem, e foi prontamente debelada, pela técnica altamente sofisticada, a retossigmoidoscopia flexível. Estes nomes esotéricos, desconhecidos por mim, mas agora tão familiares quanto o dia e a noite, ficam saltitando em minha imaginação, correndo e pulando como duas crianças peraltas.
Aliás, é um bom começo, uma boa notícia, para quem foi surpreendido e cumprimentado pelo deus do mal, em pleno ano-novo.
Que seria de nós não fossem as descobertas milagrosas? É pena que as invenções científicas e o progresso material tendem a atingir o ápice em descompasso com o progresso espiritual e moral que, desafortunadamente, não conseguiu alçar às alturas daquele.
Confissão
Pois bem, confesso que esta luta desigual não foi só minha. A família (esposa, filhos, cunhados, sobrinhos), os amigos, colegas e pessoas desconhecidas, até então, foram e são os artífices desta gigantesca reviravolta, deste fenomenal vendaval, que desmanchou, por completo, aquele complô articulado pelos dois famigerados adversários.
Tribute-se também aos médicos que me vêm assistindo nesta notável proeza. Eis que o médico é primordial para a cura deste mal, porque ele é o verdadeiro anjo na Terra. Tem a missão de curar. Quando, porém, sua cura não se limita ao corpo e ele consegue ultrapassar o estreito túnel entre o corpo e a alma, então, ele atingiu a plenitude na sua profissão, pois nele se juntaram o médico e o humanista.
Agradecimento
Muito obrigado a todos vocês, que tornam possível minha plena recuperação, com o carinho de suas palavras, as mensagens, os telefonemas, as orações, não importam a etnia, o rito e a religião que professem, porque Um só é Deus e um só o homem.
Muito grato aos médicos, que tudo fizeram e fazem, utilizando a tecnologia mais avançada e o humanismo próprio dos ungidos do Altíssimo.
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Leon Frejda Szklarowsky