Sobre a inveja, gostaria de admitir que possuo sim, e igual a muitos outros que também tiveram a coragem de admitir a sua própria.
A inveja manifesta-se sob qualquer forma, e em qualquer contexto, seja no texto que você gostaria de ter escrito, ou na palavra apreciada que você poderia ter dito. Confesso que senti inveja de Roberto Carlos pela letra de Sua Estupidez. Quem nunca invejou a avó de García Márquez, simplesmente por ser parecida com todas avós de todo mundo, e aquele seu melhor artigo que você nunca escreveu.
A inveja vem numa forma saudável de extrema apreciação pelo objeto a ser invejado. Uma sensação de aprovação perante todos seus pré-requisitos. A satisfação de vislumbrar aquilo que você sempre pensou, mas nunca teve palavras que descrever.
Já senti inveja de tantas coisas, e tantos amigos, e como dizia Drummond de Andrade: “Alguma vez os invejei. Outras, sentia pena de tanta vida que se exauria no viver enquanto o não viver, o sobreviver duravam, derdurando”. Senti até inveja dos pequenos amigos, e às vezes, daqueles que ainda nem conhecia, mas que se tornaram meus amigos em decorrência à alguma inveja escondida atrás de um profundo respeito pela obra do novo amigo.
Alguns novos amigos, também confessaram que já sentiram inveja por algo que eu escrevia, e confesso que a inveja sentida lisonjeava-me a cada dia. Sentia-me respeitado e apreciado, e talvez fosse até boa a nossa inveja compartilhada e escondida. Agradeço àqueles que sabem quem são, e sem que eu mencione seus nomes, possam identificar-se com tudo descrito aqui, movido apenas pela forma de uma inveja contida e saudável sentida.
Recentemente, senti inveja do maestro Medaglia por seu artigo: Os Caminhos da Tropicália, onde ele dizia que o Tropicalismo acabou, e seus representantes estão mais preocupados com carreiras individuais sem pensar na liberdade de expressão já adquirida. Queria ter escrito o que Júlio Medaglia dizia em seu artigo. Ele dizia que as pessoas na sala de jantar, não mais pensam em repartir a refeição igualmente entre todos, e ainda assim deixar uma bagagem cultural ao que seguirem. As pessoas na sala de jantar estão mais preocupadas em satisfazer o próprio umbigo, e esqueceram-se que a liberdade de expressão recém adquirida, está sendo revogada na forma de modismos, bunda-lê-lês, pagodismos, e deprêcionismos.
Queria acrescentar ao que foi dito pelo maestro Júlio Medaglia, que os mesmos que mostraram-se irredutíveis ao Tropicalismos, e fizeram parte do irredutível coro dos descontentes. Hoje aceitam quietos e calados, uma movimentação nociva à música popular brasileira. A inserção de bundas, garrafas, tigresas, popozudas, preparadas, cachorras, enfim um verdadeiro zoológio de zoonoses.
Júlio Medaglia ressaltou apenas, que Tom Zé permanece o único sentado à mesa na sala de jantar, que tem uma verdadeira preocupação em contribuir artisticamente à música popular brasileira.
Minha única alegria foi ter encontrado as músicas mais raras do Mutantes no http://www.audiogalaxy.com como gravações com Ronnie Von e Nana Caymmi, e ainda com a Bandinha Tropicalista de Rogério Duprat. E pensar que aqueles músicos fizeram tudo isso vinte anos atrás, e hoje a música parece que retrocedeu, e fez o caminho mais fácil à consagração.
Quisera eu ter pensado nisso antes...
[O artigo Os Caminhos da Tropicália de Júlio Medaglia está publicado na Revista Bravo e no site de Tom Zé: http://www.tomze.com.br/art81.htm]
(Agradeço ao Lúcio Jr. e ao Beto Muniz, por inúmeras e diversas razões, que não vem ao caso serem mencionadas novamente)