Oi
A ausência, quando chega, me preenche de vazio, me absorve com o nada e me abastece de saudade. O vazio desponta na curta distância de tempo entre a aflição e a amargura, e nas recordações que se mantém cada vez mais vivas.
A ausência me maltrata mais porque inevitavelmente fico a relembrar e aguçar a memória, indo ao encontro do passado, dói no coração e sacrifica a alma, angustiando até aos que são amigos que muitas vezes me observa cheia de desconforto e devaneios silenciosos num encontro a sós com soluços suaves de melancolia. É como um buraco negro cheio de universo e imensidão. A saudade não pede licença, chega sem avisar e me acompanha nos momentos que me afligem e me desmorona perante a vida.
O vazio está na simplicidade da sala, onde comeríamos as deliciosas bombas de chocolate e os saborosos doces, tomaríamos café com bolachas ou bolos de milho nos finais de tarde. Está no repouso das almofadas sobre o sofá e no silêncio vendo um filme na TV. Na nostalgia quieta da cozinha onde conversávamos pelas manhãs, ouvindo bagunça nos quartos. O vazio, ali está, no cheiro da grama verde, na erva cidreira e erva doce, ao correr até cansar e deitar-se ao beijos pelo chão, nos sacos de presentes, no armários a garrafa de vinho, a espera dos nossos paladares insaciáveis nos aniversários e comemorações ou até em algumas noites.
O sentimento de vazio está no sossego do velho piano, no porta retrato com a foto sorridente e antiga, nos castiçais no aguardo de mais um jantar, nos guardanapos coloridos guardados, no edredom fofinho e perfumado sem uso, no guarda-roupa vestidos, roupas e lingerie intocados aguardando uma ocasião especial e os perfumes com suas fragrâncias doces aromatizando o interior da gaveta. Sinto um vazio nos objetos, cartas, cartões e ...que ficaram e que continuarão intocáveis porque uma agressão a lembrança pode me fazer chorar.
O vazio está no sorriso solitário para minhas crianças cheias de plenitude. No vaivém das semelhanças delas, na falta de quem aqueça o meu inverno. Está nas violetas em pequenos vasos distribuídos sobre o parapeito, nas samambaias vivas e caídas sobre a lavanderia. Nas chamativas pantufas aquecendo as breves caminhadas pela casa. Enquanto a noite avança lentamente com a chuva que cai lá fora, o vazio está no plic plic das goteiras no vidro do banheiro que me faz ver a rua durante o banho quente, o vazio está e estará em tudo que já vivi e principalmente naquele que tenho saudade por não ter vivido.
