O menino vinha chutando o ar. Mãos no bolso, cabisbaixo. Na rua, outros garotos jogavam futebol em um campinho improvisado. Os chinelos tomavam lugar das traves e os paralelepípedos se tingiam de verde. A partida era meio truncada, pois a cada vez que um carro passava era preciso interromper tudo. Além do que, jogar bola na ladeira não é uma tarefa das mais fáceis.
Com as idéias a mil, o menino não parecia dar a mínima para a peleja que era travada ao seu redor. Dobrou a esquina, continuou caminhando e o barulho dos moleques fanáticos por bola ficou para trás, até o menino se encontrar novamente sozinho. Silêncio. Ele ouvia apenas sua respiração.
O coração batia forte. Os passos já não eram mais tão firmes. O peso da mochila em suas costas já o transformara em um camelo. O cansaço era visível. As pernas bambeavam. Nervosismo? Voltar daquele jeito era reconhecer a derrota. Coitado!
Ele já sabia o caminho de cor. Estava quase lá. Passou pela vendinha do Matias, uma de várias que existia nos arredores. Seguiu em frente. Acanhado, não cumprimentava ninguém. Cabeça erguida, precisava manter a cabeça erguida! Pelo menos isso. Mais à frente, desviou do coco de cachorro que ocupava grande parte da calçada. Muitas vezes, desatento, ele já havia pisado na merda de algum animal. Dessa vez, tivera mais sorte.
Atravessou a rua após o verde. Esbarrou em um pedestre que fazia o caminho inverso. Quase caiu. Esboçou um pedido de desculpas, mas vendo que o outro seguiu seu caminho sem olhar para trás, fez o mesmo.
Andou mais dois quarteirões, abriu o portão do sobradinho e subiu os degraus que davam acesso a porta da casa. No topo da escada, gritou pela mãe. Ela veio, abriu a porta e trouxe consigo um sorriso sarcástico que logo se transformou em mimos para o menino que nem há cinco horas havia prometido nunca mais voltar.