“ Era fim de madrugada
estava eu na estrada
com uma pressa danada;
Ao passar num encruzilhada
Escutei uma uivada
Coisa de alma penada
Forte como uma trovoada
Que me deixou assustada.
Dormi toda apertada
Na minha cama gelada
Acordei toda molhada
No meu pescoço uma unhada
Olhei para o lado desconfiada
Vi, imóvel, deitada,
Uma grande onça-pintada.
Me seguiu a despeitada
Pois minha saia era ousada
E eu tava toda perfumada
E agora me pegou pelada
Trêmula e desarmada
Num situação nada engraçada.
Mas até que me agrada
Olhar essa amarelada
Me olhando despudorada
Afianda a sua espada
Para me dar uma cravada
E eu, um presa tão coitada,
doce feito marmelada
à mercê das garras afiadas.
A fera de língua adocicada
Me lambeu feito goiabada
Me deixou toda asseada
Usou suas narinas aguçadas
Nas minhas partes não-aromatizadas.
Sei que tal forma não é adequada
Mas me senti protegida, agasalhada.
Nunca fui tão desejada
Como naquela manhã ensolarada.
Fiquei bastante amansada
Pois aquela anelada
De pele encarpetada
Me deixou bifurcada
Pois foram suas dentadas
Numa gostosa açoitada
Que a tão bem adestrada
Me deixou descabelada
Em posições variadas.
Embora um tanto machucada
Nem reclamei com a delegada
Pois ela, interessada,
Podia querer dar uma procurada
Na fera de vista acastanhada.
Eu, que era pura espinhada,
Feito égua agoniada
Fiquei como flor desabrochada
Sorridente, abobalhada,
Depois daquelas bitoladas
Que deixaram minh’alma lavada.
Mas minha sorte não é de nada
Pois a onça mal educada
Foi-se embora sem dizer nada,
Nem pra dar uma telefonada
Pra dizer que não sou namorada.
Nem sei se fui abandonada
Procurei por sua pegada
Mas a mata é muito fechada.
Minha barriga ta avantajada
Vem aí uma ninhada
E essa mãe abandonada
Sem dinheiro, sem jornada
À procura daquela danada.
O que será dessa gurizada ?
Preciso dar uma aliviada
Beber ma pinga arretada
Pra esquecer a desgraçada.
Hoje só vivo dando miada
Pelos cantos da mata desvirginada
Perguntando pra sacizada
Se viram aquela desalmada
Que deixou a esperança arranhada
Dessa que quer ser de novo caçada.
Eu, que só queria ser amada
Peguei a rua errada
E nos encontramos feito palavras-cruzadas.”