O piano murmura sons e convida para o romance. Olho a multidão e vejo mãos. Mãos soltas, largadas ao longo do corpo raso como cadáveres à espera de tumulos. Nenhum objeto do desejo, nenhum lugar para pousar, nem ousar.
Mãos tímidas, receosas de tocar o intocável. Mãos juntas como dois pilares apoiados um no outro, tão frágeis que da medo de quebrar. Mãos que se soltam com a mais leve brisa, e nem notam. Não há separação pois não há o que já não esteja separado.
Mas ruim mesmo são os olhares, ah! Como sofro ao vê-los. As mãos juntas disfarçam os olhares vazios como corações mudos dessas vazias pessoas. Olham tudo para não verem nada. Caminham, simplesmente, e não percebem que cada acorde do piano poderia acordar o silencio caprichoso do destino que colocou, ali, dois corpos inertes juntos.
Agora bom mesmo são as mãos dadas! Ah! Como e bom! Dadas, não emprestadas, sobre estas já falamos antes. São aquelas doadas pelo amor, aquelas do toque com o tato, do fato com o ato, que apertam, seguram, transformam dedos entrelaçados em artérias pulsantes pulsando desejo, vontade, medo, forca. Como eu odeio as línguas onde o são e o estão tem o mesmo significado! Ser e tão maior! E tão pouco estar que pra mim não serve! Não quero estar de mãos dadas, quero ser dada, ser recebida, ser amada. E perder meu olhar, não na multidão, mas em outro grande coração.