Uma epidemia atingiu o Brasil e Joana foi uma das pessoas infectadas, a doença era a dengue, transmitida pelo mosquito Aedes Aegypte, o mesmo transmissor da febre amarela, e parecia estar com bastante força, porém foi controlada com grande esforço da população em parceria com o governo, foi uma batalha árdua, felizmente a garota de olhos escuros, pele morena e cabelos lisos e escuros, a Joana, conseguiu recuperar-se, embora não tenha sido a mesma sorte de mil e setecentos brasileiros, mortos devido a essa doença, foi calamitoso e doloroso para várias famílias, pois perderam seus entes queridos, mas foi possível a controle devido principalmente ao controle de nascimento deste inseto. Alguns ainda teimavam em procriar o inseto, não exatamente de propósito, simplesmente faltava-lhes o conhecimento devido para entender os fatos atuais, entender a maneira de procriação e como evitar.
Após a sua recuperação, Joana decidira dedicar-se voluntariamente no combate ao inseto, no ensejo de construir uma sociedade melhor, onde houvesse menos ignorância, e mais educação, e na flor de sua idade, já tinha consciência elevada e a disposição não faltava-lhe, era atuante e decidida, porém não era o suficiente, pois descobrira a falta de interesse dos grandes laboratórios em investigar, e pesquisar a doença da dengue, como outras doenças tropicais, além de monopolizar a produção de remédios, cobrar por patentes, impediam dos países de maior interesse acabar com as suas maleficências, por objetivarem apenas grandes lucros sem a preocupação do bem estar social. Isso deixava Joana revoltada, e fazia-a ter sempre em mente o desejo de buscar alternativas para superar essa grande barreira, embora fosse difícil, pois envolvia negócios, porém com esforço acreditava poder reverter algum dia essa situação.
A sua vida era dinâmica, estudava no período matutino, e à tarde ia ao posto da dengue sempre disposta a aprender algo mais, não cansava de ler, e quando a requisitavam para fazer a catança, ou seja, recolher qualquer material propício ao desenvolvimento do mosquito da dengue na comunidade, estava sempre pronta, no final de semana era catequista, e aí achava o melhor momento para educar as crianças, pois acreditava ser as crianças o futuro, e se elas aprendessem direito iriam conseqüentemente, serem cidadãos melhores e mais conscientes. Às vezes desanimava-se, porque o trabalho de voluntário tinha os seus espinhos, nem sempre a equipe era recebida bem nas casas, onde passavam para fazer as coletas e dar as orientações básicas de combate ao mosquito, já houve vezes de terem de sair correndo, porque soltaram os cachorros em cima de sua equipe, uma outra vez ficaram todos molhados, pois a dona de uma casa onde visitavam, resolveu expulsá-los com uma mangueira de água. Mas também havia momentos de alegria, onde era possível acompanhar a mudança de comportamento e em conseqüência disso, era menos insetos atuando.
Após cinco meses estar atuando como voluntária, a epidemia fora controlada, e não havia mais necessidade de serviços voluntários, e devido ao grande esforço de Joana, deram um jeito de a contratar como estagiária, assim ela poderia ampliar os seus conhecimentos, e no futuro até quem sabe atuar nessa área como uma profissional, e nessa nova etapa, era permitido fazer cursos, e justamente num desses encontrou uma pessoa com os mesmos objetivos, chamava-se Marcos, trabalhava na Secretaria de Saúde, era o monitor dos cursos, sua aparência não era tão agradável, sisudo, quase não sorria, era tão magro que parecia estar doente, mas era otimista e um grande defensor dos direitos de liberdade na pesquisa e produção de remédios. Acreditava não ser mais possível ficar submisso aos laboratórios internacionais, se eles não quisessem investir em pesquisas como a dengue, então deveriam cobrar bem mais barato os remédios vendidos ao país, às vezes tinha pensamentos radicais, mas os justificava pela dificuldade de se conseguir benefícios há um povo, onde estavam atuando tinham de enfrentar uma batalha dia após dia, e tinham de ganhar, pois a derrota significava a morte das pessoas, e para o serviço deles ser eficiente era necessário investimentos para erradicação de doenças, principalmente as conhecidas há muito tempo.
II.
Como Joana tinha uma comunicação fácil, logo conseguiu corresponder com Marcos, ambos trocavam idéias de como melhorar os serviços públicos no combate a doenças, e esse diálogo fazia a cada dia os dois se aproximarem mais, pois viam objetivos comuns sendo compartilhados. No começo encontravam-se em cursos ou encontros, mas o namoro aos pouco foi tornando-se mais sério, a ponto de um sentir a falta do outro, eram jovens com a cabeça no lugar, sem antes dar um destino certo as suas vidas não queriam se envolver intimamente, preferiam esperar o tempo dizer qual seria o momento propício, e como não tinham tanta pressa, resolveram se ver em finais de semana alternados, pois moravam em cidades distantes, e era preciso fazer uma pequena viagem para um encontrar o outro.
A casa de Marcos era simples, era filho único, e no fundo do quintal tinha um pequeno laboratório, onde criava o mosquito da dengue para testar vários tipos de veneno, era ali onde ele passava horas com Joana, transmitindo as suas experiências e aprofundando cada vez mais em pesquisas, e agora poderia contar com uma companheira para descobrirem algo ainda a ser desvendado, não era tarefa fácil, ambos tinham consciência das dificuldades, até mesmo de trocar informações científicas, pois como não eram formados não tinham crédito, mas nem por isso era motivo para ficarem desestimulados, e pelo contrário, aguçava-os mais ainda em descobrir algo novo.
Geralmente à noite, iam andar pela cidade a procura de diversão, ou iam a uma lanchonete, ou há um espetáculo ou até mesmo há um baile, mas nem se divertindo paravam de pensar em trabalho, eram fissurados por isso, sempre sugeriam alguma alternativa para a solução de alguma questão. Teve uma vez, estavam os dois dançando, quando veio a cabeça de Joana uma idéia, e começaram a discutir sobre os pós e contra dançando, as pessoas ao lado achavam que eles estavam cantando, mesmo quando a música era só instrumental, outros achavam ser álcool demais, e assim viviam essa fase de namoro, prometendo sair daí um casamento.
Quando Marcos ia a casa de Joana, aproveitavam o momento para esquematizar e refletir sobre os estudos realizados, era o momento de passar a limpo o observado e concluído, e como a cidade da moça tivera altos índices de infestação, faziam também pesquisa de campo, ou seja, observavam e tentavam entender qual era o real motivo de tanta proliferação. A cada dia passado, acreditavam ser o relaxo um dos principais motivos de proliferação , pois os lixos jogados em terrenos baldios continham vasilhames e materiais impermeáveis, retendo a água, outro problema levantado era as poças de água na rua, como não continham produtos químicos, era um local bom para a reprodução desses insetos, e em cada canto da cidade foi verificado estas situações, fazendo com que uma simples chuva, fosse o grande estimulante para a reprodução dos mesmos. E esta situação seria dificilmente revertida, porque precisaria de uma grande conscientização, onde precisariam certamente trabalhar individualmente com cada cidadão, e isso dependia de investimentos financeiros, dos quais no momento não era interessante nem para o governo, nem para as empresas privadas, pois a responsabilidade não poderia ficar a cargo somente de um órgão, era preciso estabelecer parcerias e a sociedade civil seria peça fundamental nesta transformação.
Como o desenvolvimento tecnológico era lento, o investimento em vacinas mais precário ainda, Joana sugeriu ao Marcos de formularem um plano de Higiene Pública, e este apresentariam aos prefeitos ou até mesmo as Secretarias de Saúde estaduais, dito e feito, partiram afoitos em estabelecer este plano o mais breve possível, chegaram a faltar uma semana do serviço, para terem todas as atenções voltadas para a resolução deste problema, por eles mesmo imposto, não era tarefa fácil, pois teriam de deixar o mais simples possível, para o entendimento de qualquer cidadão, procuravam usar vocabulário simples e colocações provocativas. Estabeleceram o plano em duas partes, a primeira seria educativa, e a segunda a ação, onde promoveriam palestras nas escolas, gincanas na cidade, festivais de dança, teatro e música envolvendo temas de combate a dengue, formariam grupos voluntários de cidadãos para promover as formas de combate a infestação do inseto. Na parte de ação, em parcerias da sociedade civil, governo promoveriam as catanças, onde recolheriam todo e qualquer material impermeável, e promoveriam a limpeza das vias públicas, fossem asfaltadas ou não.
Este plano às vezes parecia ser utópico demais, mas a esperança era grande, e acreditavam na possibilidade de conseguirem algo positivo, e a partir daí partiram rumo a várias cidades, e vários órgãos de governo, sem conseguirem resultados positivos, tentaram também as associações industriais, comerciais e nada, e um dos principais argumento era o de não haver dinheiro, até mesmo porque a epidemia já havia passado, e não estavam correndo risco, e mudar esse tipo de pensamento era difícil demais, chegando ao ponto de desanimar o casal enamorado. Mesmo assim, não desistiam, sempre tentavam acreditando chegar em algum lugar, e conseguir mostrar concretamente a eficácia de seu plano.
III.
Já se passaram dois anos, Marcos e Joana ficaram noivos, ela estava cursando o primeiro ano da faculdade, e Marcos estava desempregado, fora demitido devido a sua insistência e por em prática o seu Plano de Higiene Pública, e no momento conseguia fazer apenas alguns bicos, ora como pintor, ora como servente de pedreiro, ora como balconista, estavam chegando tempos difíceis, pois não poderia casar sem ter um emprego garantido, mas isso não era exatamente um incomodo para Marcos, mas a volta da Dengue sim, acreditava estar voltando, mas as autoridades sanitárias estariam alterando as estatísticas para não haver gastos nesta área. E por maior a insistência, maior a resistência seria, e foi com essas perspectivas e nessas expectativas de futuro criada, surgiu a idéia de levar a Dengue para os Estados unidos, a idéia era simples, seria só encontrar uma maneira de tornar o mosquito Aedes resistente ao frio, assim teria enorme reprodução dentro da América, aí seria preciso contaminar alguns brasileiros e pronto, estava armado o plano.
Mal conseguia aguardar o momento de se encontrar com Joana, para poderem debater essa nova idéia, pois se a dengue infestasse os Estados Unidos, os Laboratórios dominadores de patentes, seriam obrigados a desenvolver uma vacina eficiente, e erradicar de vez a dengue. Neste momento entra Joana:
_ Joana! Joana! Eufórico e com os olhos arregalados exclama Marcos. _ Achei a maneira de erradicar a Dengue.
_ Como? Pergunta Joana, perplexa e imóvel devido ao susto tomado.
_ Se nós descobrirmos como proliferar o mosquito da Dengue nos EUA, e contaminá-los, poderemos estimular aos grandes laboratórios da América a fazerem investimentos na área.
_ Isso seria uma maravilha, responde Joana. _ O único problema é conseguir o impossível.
_ Não, não! Não é impossível, acredito ter a solução.
_ Diga logo, não me deixe afoita Marcos.
_ O segredo pode estar conseguir reproduzir o inseto dentro de um congelador, e o manter lá, assim a própria natureza se encarregaria do resto.
Foram tentar realizar esta hipótese, mas fracassaram por vária vezes seguidas, perdiam noites, atravessavam madrugadas a fio, mas o resultado era sempre negativo, às vezes pensavam em desistir, e sempre quando um fraquejava, o outro dava forças, e assim prosseguiam as experiências. Já haviam se passado três meses, e nada, nem mesmo um sinal positivo, nem sequer uma pequena luz na vastidão negra da escuridão do ignorância, mas eram persistentes de mais, passaram mais três meses, e aí conseguiram um sinal positivo, conseguiram produzir ovos dentro do congelador, e parecia estar perto o fim das experiências, não demorou um mês, e conseguiram desenvolver as primeiras espécies. Eram frágeis e sensíveis, no começo não resistiam por muito tempo, ma após um ano de pesquisas, conseguiram finalmente reproduzir centenas de insetos.
Perceberam a necessidade do frio para a reprodução dos insetos, e o calor era como um veneno fatal, os matava de imediato, também perceberam poderem transportar os ovos em ambientes úmidos, sem sofrer tanto os efeitos do calor, os mantinha vivos e era possível reproduzi-los no frio, e até aí parecia estar dando tudo certo, só precisavam agora executar o plano e viajar aos EUA. Mas para serem eficazes, teriam de ter uma grande quantidade de pessoas infectadas, para poder gerar uma epidemia e chamar a atenção até mesmo da mídia internacional, pois aí haveria mobilização popular, e certamente as autoridades norte americanas providenciariam uma solução para o problema o mais rápido possível.
A solução para a contaminação, não estava tão difícil quanto parecia, porque os brasileiros gostam de viajar mais para os Estados Unidos, do que para o próprio país que vivem, e isso era o ponto chave de todo o plano, pois os aeroportos utilizam ar condicionado, e nesta época do ano, onde é inverno no hemisfério norte, no sul é verão, junta-se a isso o tempo de férias e conseqüentemente aeroportos lotados e bem frescos. Parecia já estar tudo programado, e se a infecção fosse feita no aeroporto, ao pousar em solo americano estariam começando a aparecer os sintomas, e a partir daí era só deixar os mosquitos agirem por conta própria, e certamente em uma semana, as cidades mais turísticas já estariam sofrendo com esta epidemia.
Para não levantar nenhuma suspeita, Joana e Marcos resolveram se casar, e a lua de mel do casal seria em Nova Iorque, onde levariam os primeiros mosquitos, e a partir daí iriam de carro até onde fosse possível, pois estariam eles também contaminados, e quem sabe com um pouco de sorte poderiam escapar, e como as enfermarias americanas não estavam prontas para enfrentarem este problema, certamente eles só poderiam escapar com sorte, ou quem sabe o padrão norte americano estaria evoluído, e conseguiriam resolver rapidamente. Já estava tudo programado, passaportes, passagens, dinheiro reservado, os ovos dos mosquitos, e os mosquitos contaminados, mal esperavam o dia do embarque, talvez não os reconhecessem como heróis, ou talvez fossem até presos, mas era o risco corrido, pois acreditavam ser pior ter consciência, e ser inútil frente a um sistema perverso e discriminatório.
IV.
O inverno nova-iorquino era bonito, com seus extensos tapetes brancos de neve estendidos pelas ruas, as lojas enfeitadas, pois era época de natal, as pessoas felizes nas ruas fazendo suas compras de natal, em cada ponto turístico soltavam uma leva de mosquitos já previamente contaminados, não esqueceram de nenhum aeroporto, pois os turistas brasileiros eram portadores da infecção, e passariam por ali, não esqueceram de soltar várias levas de mosquitos frente aos hospitais, pois ali seria o lugar de maior contagio, porque haveria certamente grandes concentrações de pessoas contaminadas, e onde andassem sempre portavam um vidro contendo dezenas de mosquitos.
Por onde passavam tiravam fotos, para lembrarem dos fatos acontecidos, uma espécie de memórias futuras, em três dias já tinham rodado pelos principais pontos da cidade, quando perceberam algo diferente nos sintomas da dengue, estavam sentindo mal, ao passarem pela portaria ambos desmaiaram, foram socorridos pela ambulância de plantão ao hospital mais próximo do hotel, onde foram isolados, pois a doença manifestada neles era desconhecida ali. Aos poucos a mídia foi tomando o conhecimento dos fatos, até mesmo por estar toda a cidade infestada de mosquitos, e pessoas tendo sintomas diferentes dos normalmente conhecidos, e quanto mais os hospitais lotavam, mais os repórteres assustavam a população, com especulações sobre os mais recentes fatos, e por mais que tentassem não achavam explicação, pois era difícil de explicar os motivos de tais acontecimentos. Como estavam lotados os hospitais, cada vez mais, pessoas eram contaminadas, chegando a um ponto de total desespero por parte das autoridades locais, nem se quer imaginavam o ponto de origem desta doença.
Logo as investigações policiais começaram, através do casal brasileiro, ainda em estado grave, partiram as primeiras pistas, e não foi preciso muito tempo para descobrirem o ocorrido, provavelmente, segundo as investigações da polícia local, eram terroristas sendo agentes de uma organização ainda desconhecida, certamente da Ásia ou Oriente Médio, e tinham acionado uma arma química. Com essa versão, foi possível envolver o exército e descobrir em pouco tempo uma maneira de anular a epidemia, pois já matara quinhentos e oitenta e cinco pessoas, e cada vez mais as vítimas eram mais não importando se fossem crianças, adolescentes ou adultos. Tinham de por fim a todo esse episódio, e como os principais suspeitos ainda estavam em situação grave, não tinham noção do acontecido, no começo estavam perdidos, pois não sabiam se quer por onde começar. Foi preciso um esforço grande da equipe de cientistas para contornarem o problema.
Em questão de um mês chegaram as respostas do enigma, após terem falecidos mais de duas mil e quinhentas e vinte e duas pessoas, realmente era um tipo de dengue, mas como teve de ser adaptada, numa versão gelada, essa doença atacava as pessoas da América de uma forma, enquanto as vindas do Sul das Américas, atacava de outra forma, sendo impossível a sua cura, sendo assim, todos os doentes latino-americanos, eram isolados e deixados a sorte. A vacina foi criada em laboratórios secretos, efetivamente chegaram a cura, puderam salvar os americanos, porém os latinos não foi possível, inclusive Joana e Marcos, mortos por essa terrível doença criada por eles mesmos e sem saber conscientemente das suas conseqüências. As informações foram impedidas de divulgar, nem mesmo as pessoas obrigadas a tomarem uma vacina sabiam exatamente o motivo, foi realizada uma grande vacinação em massa com alegação de prevenir um ataque terrorista, assim conseguiram manter a cura da dengue em segredo, e em pouco tempo as pessoas infectadas foram sarando, e os mosquitos erradicados com um eficiente veneno.
Talvez dois sonhadores tenham morrido em vão, ou talvez a morte de Marcos e Joana venha modificar alguma coisa na relação laboratório-comércio-paciente, pois é de certa forma inadmissível há um país não dominar as tecnologias necessárias para beneficiar o seu próprio povo, e mais inadmissível há um outro país não compartilhar conhecimentos científicos, quando a doença é de ordem epidêmica, pode-se até pensar qual seria o valor dos seres humanos localizados em cada parte do globo terrestre, pois alguns podem ter acesso a quaisquer tipo de informação e benefícios, e outros não. Para não ser criado nenhum mal estar diplomático, os latino-americanos, nunca mais voltaram a pátria-mãe, mesmo depois de mortos.