O sol estava estalado no céu azul do mês de janeiro, causando um calor insuportável lá pelas três da tarde. Não havia uma alma sequer naquela desolação calorenta, a não ser João, o bom filho de José, que decidiu ficar na roça até um pouco mais tarde.
Moço jovem e forte, João só tinha olhos para a enxada e o exaustivo trabalho na lavoura. No esplendor de seus 16 anos, não sabia ainda o que era mulher e nem das sensações estranhas e maravilhosas que haveriam de surpreende-lo minutos mais tarde.
João transferia o castigo inacreditável do sol à sua persistência inabalável na lida, seus vestígios de preguiça esvaiam-se junto ao suor a medida em que golpeava a terra com precisas e eficazes enxadadas. Mas a enxada, por minutos, parou.
A coisa de trinta metros da lavoura, passava a linha do trem. O barulho demolidor e possante da locomotiva e das composições já não era novidade para João, mas naquele dia ele olhou por uma fração de segundos o terceiro vagão de passageiros. Sentada na penúltima fileira havia uma moça com laços no cabelo que olhou para ele. Fisgado pela imagem, o lavrador não a perdeu de vista pelo minuto que pareceu uma eternidade.
Tanto ela quanto ele estiveram unidos por um minuto, um minuto que mudaria a vida dos dois. O sol achou uma nuvem e se escondeu, enquanto a enxada deixou de golpear a terra naquele dia.