Observação: este conto é historicamente datado, conforme se poderá observar nos detalhes finais.
Trata-se de um escrito muito antigo (1968), mas que resolvi colocar aqui agora. Espero que gostem e, se quiserem fazer alguma crítica, escrevam para rimofa@bol.com.br. De qualquer forma, se você o ler, agradeço a paciência.
INDIFERENCIALHA
E agora, ali, estava ele. Sentado. Só.
Na praça. O banco, um convite. O cansaço.Ossos moídos.
A praça deserta. Quase. Um menino a brincar. A brisa soprando, folhas caindo.
Fecha os olhos. Por um instante, a paz. A babá, de longe, observa.
Pensando. Por quê?
Relembrava. O dia da decisão. "Vou fazer História". E a família queria um médico. Um engenheiro. Gritaram. Ele mais alto. Não retrocedeu.
E agora, preparava-se. O estudo sem trégua. O vestibular. Cada vez mais perto. O cansaço.
E a rotina: de manhã o banco, um almoço rápido, os livros, o jantar tarde, os livros, o sono, o banco, o almoço, os livros, o jantar, os livros...
De novo os livros. Devorava-os. Dormia sobre eles. Quase sempre. O cansaço...
E, agora, ali, pensando: por quê?
Era preciso. Venceria. A vitória ou o caos.
O menino. Brincando. A babá. Olhando. Indiferentes.
E ele lembrou-se de quando era menino. Em sua pequena cidade. A esta hora ele ouvia a Ave-Maria. Tocada na Matriz. Jogando bola. A turma. Numa praça.
Viu os anos passando. O menino crescera. E agora, ali, noutra praça, ele ainda ouvia a Ave-Maria. E via-o menino. A bola. A turma. A mãe chamando pro jantar.
O sorriso nos lábios. A doce recordação. Hoje o menino tinha que viver só. Não mais bolas. Não mais a turma. Não mais Ave-Maria. Não mais a mãe chamando. O vestibular. O cansaço. O vestibular. Já era hora. Dos livros.
Levantou-se. Deixou o banco. A praça. O menino. A bola. A turma. A Ave-Maria. Deixou-se. E foi.
Caminhou. Perto passou da babá.
- Quantas horas, hem? O susto. Olhou-a.
- Por favor, quantas horas?
O relógio. - 5 prás 7.
- Já? Dinho, gritou ela, vamos embora. Tá na hora do Antônio Maria!.