O LOBO, O CABRITO E A COUVE...
No meu muito saudoso livrozinho da terceira-classe, após dois anos absorvendo o som-imagem das letras, das palavras e dos números, depararam-se-me então os primeiros conteúdos para exercitar o raciocínio. Entre eles, havia um interessante contozinho que os que mais ao menos abordam a minha idade decerto também conhecem, sobre o problema que surgiu a um antiquíssimo barqueiro, quando teve de transportar para a outra margem do rio, um lobo, um cabrito e uma couve, mas em seu barco e em cada viagem, apenas havia lugar, contando consigo, para um dos elementos.
Ora, se o homem optasse por levar primeiro o lobo, o cabrito comia a couve. Se tomasse a couve, o lobo comia o cabrito. Assim, não tendo outra hipótese, transportou o cabrito e deixou o lobo com a couve. Seguidamente, após largar o cabrito tranquilamente a pastar no outro lado, regressou com o barco vazio e transportou de seguida a couve. Só que, desta feita, ao deixar a couve, retornou com o cabrito. Prosseguindo no vai-e-vem, deixou o cabrito e levou o lobo de novo para o pé da couve. Mais uma vez de regresso com o barco vazio, foi buscar o cabrito e, através desta engenhosa canseira, conseguiu colocar os três protagonistas na outra margem conforme lhe fora encomendado.
Interessante?! Há quase 58 anos atrás, o aludido textozinho incentivou-me a curiosidade para diversas releituras e, quiçá daí, eu tenha adquirido imediata propensão pelo gosto de ler tudo. Só que, considerei mais tarde - e é sempre tarde de mais - que me habituei demasiadamente ao sonho simples de resolver os problemas. Afinal a vida e a realidade constituem deveras factos muitíssimo diferentes e muito mais complicados.
A nu e cru, naquele ano de 1949, nenhum homem desarmado, tal como o diligente barqueiro, se atreveria a enfrentar um lobo. Todavia, o texto que resumi, iniciava o relato assim:
No tempo em que os animais falavam, a um barqueiro se encomendou o transporte, de uma para a outra margem do rio, de um lobo, de um cabrito e de uma couve...
Que singelo e lindo !
Poderei porventura em azado ensejo colocar uma questãozinha também muitíssimo simples? Na exposta situação, postas as óbvias e incontornáveis dúvidas, entre dois barqueiros, como se transporta uma mulher para o outro lado do rio?
Então não é mesmo simplíssimo? Afunda-se um dos barcos e manda-se a mulher atravessar sozinha no outro! Ela voltará quando quiser...
Cada vez é mais lindo-lindo! António Torre da Guia |