Era noite, quarta-feira de tremedeira.
Vem a notícia e o chamado do coração
Põe parente, põe toda a gente de
Fatiota, pois é hoje o enterro de Carlota.
Moça fina, de juízo e distinta família,
Sempre séria a boa menina, muito sizo.
Nunca um sorriso teve em seu rosto lindo
Nem pra si nem a ninguém que
Pudesse enfim colher um dia, seu mel
Incandescente que ora jaz tão silente.
Carlota boa de rezar, de fazer rendas, como
Toda moça de veludo, com agulhas afiadas,
Sempre tecedeira, cheia de boas maneiras,
Levava os rapazes à loucura, que sem
Esperanças lamentavam tanta castidade...
Doceira de primeira era assim essa menina
Bem certeira, que ao amor sequer mostrava
Um leve tom de brincadeira...
Na cidade tão pequena, famosa, toda garbosa
Ia ela à igreja de missal e ar contrito, a deixar
Moços aflitos aos mistérios da donzela,
Que a ninguém dava uma olhadela.
As senhoras guardiãs da virginal criatura,
Sempre orgulhosas dos tantos predicados
Pregavam aos quatro cantos suas virtudes a
Todas as raparigas fogosas, na esperança de fazer
As perdidas se converterem...
Assim seguia Carlota,
Pouca fala, de beleza com certeza, de atitudes
A causar inveja a toda juventude, mas será que
Essa tão incomparável criatura era mesmo
De verdade ou só um sonho da saudade?
Mas um dia que surpresa, tal pureza
Com toda sua esperteza, deixou a todos
Aterrados, pois veio anunciar que
Ao novo amanhecer seria o dia
De revelação.
Todo tempo de recato
Para seu trabalho fazer, e ganhar
O tanto pra comprar seu negligé
Já era chegado o seu tempo
De emputecer.
E o povo desolado,
Estupefato acompanha
A moça pura até o largo da estação
A verem dali o seu enterro,
O enterro de uma grande ilusão!