– Um dia, parei para pensar e fiquei abismado com o tempo que tinha perdido. Chamaram-me louco porquanto eu deixei minha vida boêmia para lá. Só agora eu notei que os conselhos do velho do alto da serra eram válidos.
– O tempo que você acha que perdeu não volta mais. Na verdade, você não perdeu o tempo. Apenas, não soube usufruí-lo a contento. O tempo passou e você ficou parado sem nem observar a sua riqueza e o seu viço.
– É vero. Mas ele ainda está comigo, vagueia em minha volta, e me convida para desfrutá-lo.
– Com certeza, nunca é tarde. Nunca é tarde para navegar.
– O vento dizia: Acompanha-me. O velho dizia: Segue o vento. Eu continuei imóvel.
– Contudo o vento fala: Ainda há tempo.
– Então, decidi comer e beber o tempo, que abre suas asas, mas prossegue numa rapidez fantástica.
– Vai depressa. Segue o vento enquanto há tempo. Observa as andorinhas que sempre estão com pressa para a partida. E voam, e voam porque reconhecem que é preciso voar. Sempre.
– Ao redor, tudo se agita. Um eterno rebuliço. Rebuliço na rua, rebuliço na festa, rebuliço na casa da frente por causa da moça bonita, sempre cercada de amantes, rebuliço no bar, rebuliço no lar, rebuliço na esquina, rebuliço na estrada, no ponto de ônibus, rebuliço na igreja, rebuliço na escola, na hora da ave-maria. Rebuliço na alma, rebuliço em meu ser...
– A vida é isso. Não pode parar. O seu oposto é a morte. O tempo, a ponte que os dois liga. Enquanto há vida, eis a ponte.