Enquanto eu enfrentava uma fila no banco para pagar algumas contas, uma senhora, com uma criança de peito em seus braços, surgiu diante de mim. Postou-se a meu lado e, de vez em quando, devido ao seu movimento oscilatório ao acalentar o bebê, o corpo da criança roçava meu braço. Disfarçadamente, afastei-me um pouco, na tentativa de evitar o incômodo atrito, mas ela, automaticamente, acompanhou o meu movimento e, assim conseguiu frustrar minha intenção. Resolvi então puxar conversa com a senhora, virando-me de frente para ela - nem me recordo mais sobre o que conversamos - mas só sei que me livrei definitivamente daquele tormento.
Em certo momento, pedi-lhe que me deixasse segurar um pouco a criança ao que ela acedeu de bom grado e colocou-a em meus braços, o que me causou um bem-estar paternal fazendo-me voltar ao tempo em que embalava os meus irmãos mais novos.
Mas, o que aconteceu em seguida, foi bastante estarrecedor: seu corpo, num processo paulatino, começou a desmilinguir-se, e decompor-se em minhas mãos. Percebi então que estava reduzido a uma pequena posta de sangue que eu, profundamente nauseado, cuidei de devolvê-lo à mulher que, ato contínuo, esfregou em minha jaqueta aquela gosma repugnante, enquanto dizia quase aos gritos, apontando para mim:
- Essa criança era sua; por isso cheguei a esfregá-la em você para que sinta o quanto perdeu e continua perdendo.
Ergueu as mãos segurando a coisa, e continuou:
- Aqui ainda há vida, e se você tiver a coragem e persistência de um vencedor, poderá recomeçar e auferir muitos trunfos com isso aqui. O inconcluso jamais será realidade.
Atirou em meu peito o resto da posta de sangue, e desapareceu enquanto eu me recompunha do sobressalto.