Saulo abre a porta da locadora e vai entrando, dá de cara com Lourival e, antes de desejar Boa-Noite, pergunta alto:
- Minha fita já chegou ?
- Leandro termina de atender uma cliente no outro balcão e responde:
- Acabou de chegar, aqui está.
- Deixa eu verificar se é legendado ou dublado, outro dia acabei levando um filme dublado e quando cheguei em casa foi que percebi o engano.
- Deve ter sido em outra locadora, pois aqui só temos filmes legendados.
- É, pode ser !
- Saulo, vai pagar agora ou na volta ?
- Na volta.
- Saulo, antes que eu me esqueça, você viu o gol do Romário no jogo de ontem ?
- Claro ! Só o Baixinho faz um gol daquele.
- Peraí ! Você fala isso porque você não viu o que eu fiz no jogo de Terça-feira passada.
- É melhor ouvir isso do que ser surdo ! pensou Saulo, sem falar nada, para não perder o amigo.
- Olhe só ! o jogo estava duro ...
- Duro de se ver ! pensou Saulo novamente.
- Recebi a bola pelo alto, matei a criança no peito na entrada da área e parti para dentro do beque. Saca o Junior Baiano ? Pois é ! o cara era do tamanho dele, um armário. Apliquei um “elástico” no zagueirão, ele está me procurando até agora ...
- TRIMMMM !!!!
- Saulo, não vá embora que eu vou atender o telefone, não demoro.
- Lourival, você que é primo do Leandro, diga a verdade, ele joga de quê ?
- Sendo bem sincero, ele joga de teimoso, ou então marcando o Alam ?
- Quem ?
- O Alambrado !
- Quer dizer que ele não tem a menor intimidade com a redonda ?
- É. Trata a bola de Vossa Excelência. Inclusive, ele já foi daquele time de praia famoso, o Lá Vai Bola !
- Já ouvi falar, era um timaço !
- É. Ele ficava atrás da baliza, quando chutavam para fora, ele corria pegava a redonda, devolvia e gritava: Lá vai bola !!!
- Saulo, desculpe a demora. Onde eu estava mesmo ?
Saulo resolve botar uma pilha e lhe responde:
- Ah ! Você tinha recebido a bola na intermediária do seu time e driblado três adversários, sendo que o último você ainda deu um lençol na entrada da área.
- Agora me lembrei ! Aí eu entrei na área, quando o goleiro saiu eu fingi que ia dar uma bomba, ele se jogou e eu toquei a bola mansamente no outro canto. Aí eu fui pra galera !
- Aí ele acordou ! pensou Saulo novamente.
- Leandro ! Neste gol você não tinha aplicado um “elástico” no zagueiro ?
- Ué ! Eu falei isso ?
- Claro, antes do telefone tocar você estava contando um lance, quando voltou pegou a minha dica e relatou outra jogada. Assim não dá !
- Ô Saulo ! Eu as vezes até me confundo. Vou te dizer mais, lá no clube, por causa das dezenas, melhor dizendo, centenas de gols que fiz, tem um goleiro que não pode me ver.
- Claro ! É cego !
- Pô, Saulo ! Já vi que você não acredita no meu talento.
Neste momento entra na Locadora uma pessoa que cumprimenta Leandro:
- Salve, Leandro ! tudo bom ?
- Tudo bom Otávio.
- Vai jogar na Terça-feira que vem ? Se você não for, o jogo não tem graça.
- Ué, não tem graça? Pergunta Saulo, intrometendo-se na conversa dos dois.
- Claro ! responde Otávio.
- Ele é o maior goleiro que joga lá.
- É mesmo ? Fecha o gol ? pergunta Saulo.
- Não, ele tem um metro e oitenta. Inclusive o apelido dele é Galetão, por causa da quantidade de frangos que ele engole normalmente.
- Ô Leandro ? E os gols que você diz que faz em todos os jogos ?
- Gols ? Só se for no video-game, aí sim ele arrebenta ! Faz gols à beça !
- Saulo coloca a fita debaixo do braço, se despede de todos e vai embora satisfeito, pois acabou de conhecer o primeiro e talvez o único artilheiro virtual.