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Contos-->A almotolia -- 19/09/2013 - 05:13 (Brazílio) |
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A almotolia
Não digo que as mexidas do Zé chegassem a nos fazer matar aulas só pra
ficar à sua volta, mirando cada passo seu na instalação da serpentina
lá em casa, mas seguramente nossos deveres de casa, nossas leituras
passaram por um período de significativa de baixa naquelas semanas em
que, para resumir, tudo parecia pelo cano ir.
O Zé, Raimundo de Freitas de assinatura, e Redondo de apelido e
estrutura, além de empregado da Prefeitura, onde respondia pelo setor
quiçá mais áulico do que hidráulico, era meio-contra-parente nosso,
casado que era com a Dinininha, tia de mamãe – e tia-avó minha.
Aceitou fazer nossas instalações com um misto do orgulho do bambambã
e um pouco de condescendência contra-parental, tão requisitado que
era não lhe faltava trabalho extra – e bem remunerado com mimoseios
de bom grado – nas casas de madames e de doutores da cidade. E fazia
questão de proclamar essa sua popularidade e utilidade pública –
além de espicaçar o café que lhe era servido na freqüência de suas
jactâncias. Chamava o nosso café simplesmente de ‘água de batata’ –
mas não passava sem a preciosa e obsequiosa rubiácea.
Para temperar a soberba social, contava suas anedotas, geralmente
se especializando nas funções fisiológicas do baixo-ventre. Dava a
impressão de se deliciar com o constrangimento alheio – ainda que
temporário, vítima de um ‘vento’ intempestivo e mal-dirigido – de
preferência de moça. Assim o Zé, assim como o nosso café, mas o
rodeávamos assim mesmo. Ele era bom e consciencioso no seu trabalho e
a serpentina que instalou em nosso fogão, com aqueles canos paralelos
trazendo água fria e levando-a quentinha para o cilindro eram o primor
da tecnologia que estava ao nosso alcance na certeza de um banho
quente – desde que rápido. Afinal éramos muitos e, inapelavelmente, a
hora do banho convergia pra água fria.
O Zé tinha muito zelo e até um certo ciúme de suas ferramentas, de
sorte que, prevenidos, evitávamos tocá-las. A não ser quando ele e os
nossos pais porventura se distraiam – para a nossa rápida e oportuna
aventura.
A máquina de fazer rosca em cano – naqueles tempos A.PVC, ou antes
do pvc – era sólida, pesadona e impunha respeito. A chave de cano
era por demais conhecida, pois havia uma igual, e mais nova, na casa
vizinha de vovó; a segueta não entusiasmava, ela que pra serrar um
cano era tão brava, mas a almotolia…essa sim, era toda novidade, feita
de cobre, bojudinha, com aquele biquinho comprido, afiladinho e ainda
tinha um botãozinho para se pressionar o óleo…Pena que o primo
Maurício, filho do dito Zé, naquele dia por ali, dela não largasse o
pé… |
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