O Zé chegou mais cedo, eu estava na cozinha e, quando ouvi o barulho da porta, fui para a sala. Ele estava sóbrio, eu estranhei porque isso só acontece quando ele está doente. Quando eu ia falar oi Zé, recebi um soco na cara e caí de costas perto do sofá. Não sei o que doía mais, se o soco ou a voz dele gritando “cadê o cachorro?” Quando eu ia dizer que cachorro, senti a garganta presa, acho que foi pelo sangue que saiu do nariz, não que o sangue me sufocasse, mas me assustou quando senti aquele negócio quente saindo do nariz e invadindo minha boca. O Zé nem ligou para a minha aflição, nem esperou resposta e mandou um pontapé que até agora não sei como não me quebrou costelas e afins. Eu consegui gritar acode que ele me mata, a menina falou, lá de cima: “ mãe o que é?” O Zé, quando ouviu a voz da filha, falou: “é o pai, é melhor você ficar quieta”. Ela ficou quieta, sempre ficou quieta. Eu sempre apanhei em silêncio, eu sei que quando reclamo ele bate mais. Mas hoje ele estava sóbrio. Gritou de novo: “cadê o cachorro”? Eu ia falar que cachorro, ele me puxou pelos cabelos e me jogou contra a porta. Aproveitei, quando a porta se abriu, e saí pela rua gritando ele me mata. A vizinha perguntou o que foi. Eu era só sangue e falei pega minha filha. O Zé saiu querendo me bater mais, socou minha cabeça. Antes de desmaiar ouvi a menina gritando, com um pano branco na mão: “para de bater na mãe, o cachorro saiu correndo e esqueceu a cueca”.