Miguel Urbano Rodrigues é um renomado analista político internacional do PCP que conta
a real história do tão clamado movimento ("terrorista") das FARC-EP.
Segue aqui a Introdução sobre um artigo/pesquisa feito pelo analista sobre as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia - Exército do Povo, que tem continuidade num outro artigo:
"O Genocídio da UP";
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A saga guerrilheira colombiana das FARC-EP, pela sua longa duração, pela fidelidade ao rumo traçado e pela natureza do inimigo interno e externo quase não tem precedentes no grande painel do combate armado dos povos pela sua liberdade. Será talvez preciso pensar no Vietnam para se encontrar algo parecido ao desafio perma nente ao impossível que tem acompanhado a marcha da mais antiga guerrilha da América Latina.
O real e o fantástico nas estórias e canções populares que lhe recordam o caminho apresentam-se ligados numa rede tão inextricável que se torna praticamente impossível separá-los.
Na vida das FARC o excepcional vem de tão longe que delas se pode dizer que já existiam antes de serem criadas.
Um crime político, durante a campanha eleitoral de 1948, produziu efeitos de terremoto na historia da Colômbia. Jorge Eliecer Gaitán, o candidato liberal à Presidência, o mais carismático dirigente do país, foi assassinado em Bogotá. O povo da capital reagiu com fúria. Uma onda de violência de proporções inimagináveis varreu a cidade, alastrando a todo pais. O acontecimento ficou conhecido como o Bogotazo. Na repressão genocida desencadeada pelo Exercito a mando do Partido Conservador morreram 300 mil pessoas. A Colômbia foi transformada num matadouro humano. Nas montanhas, como resposta à barbárie dos "godos" (conservadores), surgiram focos de guerrilhas liberais.
Um jovem camponês da Cordilheira Central, Manuel Marulanda Vélez, integrou-se num desses grupos guerrilheiros. Tinha apenas 20 anos e carecia de formação ideológica. A sua passagem pela escola fora breve. Mas sentia, desde a adolescência, uma sede insaciável de justiça, e horror à brutalidade do exercito e da polícia. A idéia de revolução e a certeza de que na Colômbia ela não seria pacífica precedeu nele a consciência política e a capacidade para compreende o funcionamento das engrenagens do poder.
Mas quando o general Rojas Pinilla assumiu a Presidência após um golpe de estado e decretou uma ampla anistia abrangendo os guerrilheiros que entregassem as armas, Marulanda não as depôs. Tinha amadurecido na luta.
O Partido Liberal, esse estava impaciente para se reintegrar no sistema oligárquico.
Manuel Marulanda, informado de que o Partido Comunista Colombiano senegara a entregar as armas, iniciou contactos com o comando das suas guerrilhas e uniu-se a elas com o seu grupo. Essa opção ficou a assinalar uma viagem na sua vida. Não cabe aqui o relato das proezas que fizeram dele um herói da América Latina.
Mas é indispensável recordar que quando o Exercito desencadeou em Cundinamarca e no Tolima uma ofensiva que visava ao aniquilamento das guerrilhas, Marulanda já era um prestigiado dirigente comunista. O seu caminho foi incomum: assimilou o marxismo a partir da experiência da luta; da práxis subiu à teoria. O governo lançou previamente uma campanha confusionista. A propaganda oficial inventou a República Independente de Marquetália, supostamente instalada pelos comunistas. Agigantando o adversário, a oligarquia pretendia tirar maiores dividendos das operações. Na realidade, a guerrilha de Marquetália, muito escassa de meios, tinha apenas propósitos de autodefesa das populações.
Marquetália, atacada a 27 de maio de 1964, foi defendida com coragem espartana, mas, obviamente o lugar foi ocupado pelo Exercito. O alto comando falhou, aliás, o objetivo da ofensiva. Marulanda furou o cerco, e levando consigo 45 homens e 2 mulheres, refugiou-se em paramos inacessíveis da Cordilheira.
Essa retirada conferiu uma dimensão continental ao seu nome. O Exército ajudou a formação da sua aureola de combatente invulnerável. Pela sua pontaria era conhecido pelos adversários como o "Tiro Fijo". Sucessivos governos tentaram neutraliza-lo, sem êxito, com promessas. Quarenta vezes pelo menos, lhe anunciaram a morte. A alegria foi sempre seguida da amarga necessidade de reconhecerem que, afinal, continuava bem vivo, nas montanhas, comandando a já lendária guerrilha comunista.
É somente em 1966 que ela adota o nome de Forças Armadas Revolucionarias da Colômbia -FARC, ao qual em 1982 é acrescentado o EP. Assumem-se, a partir de então como o Exército do Povo. Em 1972 batiam-se em oito Frentes; hoje combatem em mais de 60.