ANOITECER
Partiste com um sorriso triste. Os dois sabíamos que algo havia terminado e outros dias, outras coisas, recomeçavam.
Fiquei sentado, perto da mesma janela, do mesmo bar, vendo como te afastavas da minha vida. Ias livre e etérea, plena de luz e energia, quase feliz, como se o amor que nos aproximou, enrolou e envolveu, fosse nada. Talvez, ao dobrar na esquina te esquecerias das minhas caricias e meus beijos.
Uma lembrança brilhante vibrou na minha memória. Num entardecer de outono buscamos e encontramos uma praia pequena e solitária. Fizemos todas as loucuras possíveis, como duas crianças e repentinamente livres, sentimo-nos donos do mundo e de nossos destinos. Tinhas então a boca doce como uma fruta fresca e madura. Tua língua desenhava arabescos pelo meu corpo, enquanto te aproximavas e afastavas, enlouquecendo-me.
Ontem, pouco antes de aportar naquele bar, estivemos no mesmo motel de sempre e criamos o mesmo clima e idênticas caricias. Porém faltava alguma coisa. Você não estava, já tinhas partido antes de chegar . Todo o carinho, todo o amor, todo este fogo que só você sabe acender, foi se apagando dentro de mim. Aquela mulher que fazia o amor comigo não era você. Outra alma, outra sensibilidade habitavam teu corpo maravilhoso que tão bem eu conhecia. Por isso, enquanto bebíamos uma cerveja, sem conversar, fui me despedindo de ti, pouco a pouco e em silencio.
Quando dobraste na esquina senti que estavas partindo para sempre e que já não haveriam mais entardeceres na praia, tardes chuvosas gravidas de amor, noites furtivas e gloriosas em motéis, nem olhares e gestos quase imperceptíveis para outros e que fazia de nós tão cúmplices e extraordinariamente felizes.
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