A cidade assiste tristemente os vagabundos nos biongos abraçados, se defendendo do frio, enganando a fome, imunes ao cheiro azedo de suor impregnado nos farrapos, unidos pelo instinto de preservação, compartilhando o calor que os preservam. Ao lado, amontoados, papeis velhos exaustivamente colhidos de casa em casa, de lixo em lixo, de pedido em pedido, de raiva e repugnância.
A cidade assiste tristemente o diálogo dos homens importantes, defendendo ponto de vista, discutindo soluções, negociando cargos, fazendo promessas, baseando-se em sistemas, análises,pós graduações, simpósios, e nas leis dos homens importantes.
A cidade assiste tristemente os meninos nas ruas correndo da repressão, correndo da fome, correndo para o vício, correndo para a prostituição, dirigindo-se irremediavelmente para as garras protetoras das instituições dos homens importantes.
A cidade assiste tristemente os indivíduos sem nome que pisam apressados por cima de tudo, uns atropelando outros, apesar dos meninos de rua que correm famintos pelas avenidas da cumplicidade.
A cidade assiste tristemente o destino de seus filhos, levanta os olhos, e finge não ver no horizonte, por detrás dos obstáculos de concreto, o limiar da luta de seu povo.