La flecha no canta
Canta el espacio herido
Hacia el centro
Del blanco.
(Michel Corsario Croz)
Porto alegre, 14 de janeiro de 2001.
Célia, adorada amiga:
Dizem que o sonho acabou e não entendo bem se algum dia realmente começou.
Acordei sobressaltado, emergido de um rio, violento e indomável, arrastando- me no barulho crescente e vomitado sobre esta maldita cama. Um ruído ensurdecedor como de foguetes rompendo a força da gravidade, ofuscou-me a consciência. Aproximei- me da sacada, de cuecas e meias cinzas, e somente vi ônibus e carros. Tinha um gosto de gasolina na boca e um cheiro ligeiramente azedo, impregnado nas narinas. Deve ser porque é janeiro, não estou na praia e ontem a noite bebi muito; ou porque uma avalanche de lembranças rompeu minhas defesas. Não sei. Gostaria que nevasse, caíssem nuvens inteiras, sufocando o rugir dos motores e um silêncio hostil, absoluto, tomasse conta da cidade, para que todos pudessem ouvir quando meu corpo se estatelasse lá embaixo, para que tudo exploda com o estampido de revólver, disparando a bala no meu cérebro.
Gostaria de ver-te agora, quando morro de vontade de me matar. Deve ser porque é janeiro e a ressaca me come a alma.
Tchau!