O nome era Du,de Eduardo,Du do alemão,do Morro do Alemão.O maior traficante do complexo.Um comando de punho de ferro.Cento e vinte “aviões”,oitenta ‘soldados”, movimento de um milhão mensal,da branca e da preta, de tudo, menos das pedras.
Vinte e dois anos,mulato,alto,feio,forte,instintivo,quatro mortes.Nunca preso,marginal “low profile”,da periferia,o submundo do submundo,cultivava o quase anonimato.Pretendia-se uma sombra,nos buracos,um nome,uma lenda,nunca um objeto,um objetivo,um alvo.
Ge,deEugenia,24,morena,linda,gostosa,inteligente,ambiciosa,evangélica,sem vícios.Sua mulher,sua dona,seu Norte.Do mesmo morro desde os 15 anos.Felizes,sempre.
Raul era da Puc,economia,como o pai, e do Leblon.Tambem vinte e dois,tambem viciado.Quase sempre caminhava sem mirar,sem atenção,os dias passavam sem sentir, janeiro passava e abril, sem sentir.
Em casa Thales e Helena perplexos,inúteis admiravam aquele exemplar,tão magnífico de uns tempos atrás, perdido agora. Com certeza usava drogas,nosso filho.Usamos um pouco no nosso tempo de faculdade,mas agora é muito perigoso. E esses caras com o ele andava, Divo, Cabeça, Neguinho, tudo de pai separado,sem destino, sem donos nem vontade ,parados como Raul. Más companhias ou má companhia,nosso filho.
Raul seguia e com a turma ia buscar os bagulhos ,no Alemão.Um dia deu rolo,Cabeça atrasou o pagamento de uma partida da branca. Du mandou recado, queria dar um aviso,até porque gostava do cara ; maior craque no futebol de areia,do time deles.Cabeça cagou-se,ia sumir mas não subia lá.Raul que imaginava como ia acabar essa história resolveu ir no lugar do amigo,era mesmo muito desligado pra essas coisas.Afinal que mal faz conversar.
Foi, falou com um ,falou com outro e foi marcado o encontro,no Cruzeiro, lá em cima .Chegou e de cara não acreditou em duas coisas que viu,o Rio e o horizonte as seus pés,tão lindo,tanta paz.E Ge,tão linda,tanta paz,ao lado de Du.Seus olhos se cruzaram num primeiro e rápido instante e uma corrente elétrica percorreu a espinha do garoto,sentiu o pênis intumescer,coisa que não acontecia há tempos. Conduziu a conversa numa boa, firme e decidido como nunca havia sido nesses últimos tempos e, apesar das ameaças conseguiu novo prazo e garantias para Cabeça.
Du e Ge gostaram muito dele. Ela, aliás nunca mais esqueceu seu jeito frágil e desajeitado,sua voz calma, seu sorriso,Ge também tinha sido percorrida por um raio,quando viu aquele cara,o avesso de seu Du. Noutro dia encontrou-o num shopping, conversaram qualquer coisa, como o tempo que impedira a praia naquele dia, resolveram entrar no cinema, qualquer filme, só prá distrair. Lá , juntos no escuro, as pernas se tocaram,os braços também, as mãos, as bocas. Saíram num taxi para o motel. Entrega total, tudo muito intenso, gozaram e gozaram muito. No relaxo pós orgasmo,ela distraida,fumando,disse que Du tinha gostado muito dele,da firmeza, da atitude, da seriedade, dele mesmo. Sabia que o Du era bi? Gostara porque também achou-o meio ambíguo. Naquela noite transaram os dois pensando em Raul e ele disse isso prá ela.Ela não falou nada mas sentiu antecipado no orgasmo com Du, o orgasmo que tivera agora.
Era paixão muito forte, escondidos de todos, não passava tempo sem a necessidade de se tocarem,de se falarem,de estarem juntos. Ninguém desconfiou, nem podia.
Du continuava no comando da bandidagem e Ge era seu gerente de contas e acertos, a pessoa de sua maior confiança, quem recebia, quem pagava, quem comprava, quem aplicava, quem planejava, seu braço direito, sua mulher, seu tudo.Com sua doçura, era o real comandante do Alemão, disso poucos sabiam.
Na Sexta 13, um dia que não gostava, de dezembro, Du escalou Guga, Baixinho, Linguinha, Magro e Magrão, Buriti, Praga e Naldo, que com os AK e as Uzzi, eram seus melhores soldados, os mais fiéis, os mais cruéis manos. A tarefa era uma expedição de punição ao bando rival do complexo da Maré, longe. Por isso tinham que ser rápidos e objetivos, tudo no maior sigilo. Sairiam em três carros,com fardamento da polícia, pouco antes das quatro da madrugada. Uma como muitas outras missões de extermínio entre bandos rivais, diriam as páginas policiais no outro dia.
Não foi bem assim, os rivais souberam de alguma maneira e os esperavam. Chacina, morreram todos, Du à frente com mais de trinta tiros,como descreveu o laudo de necrópsia.
Ge chorou muito no enterro e por mais sete dias, luto geral no Alemão. Depois assumiu de vez seu papel, tocou o negócio e o bando prá frente, fez de Louri, de Lourivaldo, um magrelo vesgo e feio mas de confiança, seu sub comandante e de Raul, seu novo marido, com o conhecimento de todos no morro e aliás com assentimento e respeito.
Raul agora , com seu laptop de 1 Giga, ajuda Ge na contabilidade e na distribuição e gosta muito do que faz. Thales e Helena se deliciam com os netos, Eduardo, o Du e Beatriz, a Bia, a alegria e festa daquele apartamento do Leblon, adoram a nora e estão tranquilos com a felicidade e prosperidade de seu Raul.