Em frente ao terminal de ônibus, todas as noites, duas gatas se sentam.
A primeira, negra. O pequeno corpo muito bonito. Cabelos pixaim desgrenhados e mal amarrados. Short curto colado e top, não importa o clima.
A segunda, loura. Cabelos tingidos e pouco embaraçados, o que resta da vaidade. Rosto desenhado por macios traços e roupas largas. Roupas que não eram suas.
De quem eram as roupas?
Dos poucos transeuntes se acaloram com olhares piedosos.
Sorriem despreocupadas e conversam. Desfrutam inocentemente do poder de mulher em desenvolvimento.
A dúvida intriga por instantes a evangélica velha e gorda que passa – Onde estão os pais dessas meninas?
Os dois amigos que sobem o morro em direção do terminal não querem ver policial.
Tiram os trocados amassados do bolso, vão ao mato de trás do colégio próximo. Consumam o ato sem nenhum respeito ou cuidado. No prazo de 15 minutos vão ao bar beber e se vangloriar da masculinidade. Ninguém pergunta o nome das donzelas. Corações virgens que não conhecem o amor.
As meninas vão para a esquina conhecida comprar seu brinquedo em forma de pedra, com o dinheiro suado do trabalho.
Voltam para o mato brincar e conversar. Única diversão para essas crianças. A mente destruída não tem lembranças. O corpo entorpecido não sente dor.
Na noite seguinte, como todas as outras, duas meninas sentam-se encostadas no pequeno monumento em frente à biblioteca, em frente ao terminal de ônibus. Uma lápide comemorativa feita de concreto, inteiramente pichada, cuja placa fora arrancada há muito tempo.