Usina de Letras
Usina de Letras
18 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 


Artigos ( 63231 )
Cartas ( 21349)
Contos (13301)
Cordel (10360)
Crônicas (22579)
Discursos (3248)
Ensaios - (10681)
Erótico (13592)
Frases (51755)
Humor (20177)
Infantil (5602)
Infanto Juvenil (4947)
Letras de Música (5465)
Peça de Teatro (1387)
Poesias (141310)
Redação (3357)
Roteiro de Filme ou Novela (1065)
Teses / Monologos (2442)
Textos Jurídicos (1966)
Textos Religiosos/Sermões (6355)

 

LEGENDAS
( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )
( ! )- Texto com Comentários

 

Nossa Proposta
Nota Legal
Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Contos-->Apenas Uma Mulher -- 08/03/2002 - 04:39 (Felipe de Oliveira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Às vezes tenho crises terrìveis e acho que a minha vida é uma merda, outras vezes, penso que sou a mulher mais feliz sobre a face da terra. Sou eu que crio essa atmosfera. Nem sequer acredito que vivo essa face de encantamento. Pouco importa que dure apenas um dia, uma semana ou um mês. Gozado assistir a vida escorrendo entre os meus dedos. Por vezes, penso que sou um personagem criado por mim mesma, estes personagens ridìculos de desenho animado que passam todos os dias na televisâo.

Faço cotidianamente coisas normais para os outros, coisas que estâo dentro de um contexto social, porém, no fundo de mim mesma acho tudo isto estranho e ridìculo : estudo inglês desesperadamente como se a qualquer momento os ingleses fossem invadir o Brasil; nado e malho todos os dias como se a qualquer hora pudesse receber um convite para pousar nua; leio velhos livros empoeirados e plenos de aberraçôes.

Ajo como se tudo isto fosse importante. Todas essas coisas que faço cotidianamente servem para nâo esquecer que estou viva. Vivo os amores dos livros, sinto os desejos daqueles que desejam verdadeiramente alguém, preencho minha existência e evito pensar no vazio de tudo isto. De que adianta todos me acharem bela e inteligente e outros tantos outros, se ninguém me ama do jeito que eu quero, se ninguém me toca febrilmente, se ninguém me dà um beijo de verdade, daqueles que sò se dà quando se està verdadeiramente apaixonado. Nâo existe màgoas profundas. Apenas um mal-estar. Algo que vai se criando entre o meu eu mais profundo e essa pessoa que age normalmente todos os dias. Uma distância enorme. Algo muito grande entre mim mesma e essa imagem. Uma barreira intransponìvel, deixando-nos, todos os dias a quilometros de distância.

Eu apenas finjo viver uma vida. Distancio-me e vejo os meus dias enfadonhos. Um medìocre seriado de televisâo. Essa vida que finjo é a minha verdadeira vida. Preciso me explicar melhor, dizendo assim, ninguém vai entender. Na realidade, apenas finjo viver minha vida : o meu cotidiano é repleto de falsos encontros, movimentos e frases repetidas. Objetivos inalcançàveis, coleçâo de desilusôes, dores matinais e algumas vezes retiro até mesmo um prazer mòrbido deste emaranhado de dias repetitivos.

Mas essa vida que finjo nâo é a ùnica. Existe uma outra vida que inventei para mim mesma. Uma vida falsa que com o tempo vai se metamorfoseando na minha verdadeira vida. Uma invençâo de menina que, aos poucos, vai modificando o meu cotidiano e colocando os meus sentimentos e sentidos num plano superior. Algo até hoje inimaginàvel.

No dia do meu aniversàrio eu nâo quis nenhum presente. Fiquei incògnita. Meio soterrada. Meio detràs do espelho. Rezando para que ninguém viesse festejar minha nova idade. Ninguém pode oferecer o que realmente desejo. Desnudo-me deste eu empoeirado e saio para a alegria das ruas. As pessoas olham de lado. Os homens desejam. Uma multidâo de pretendentes as delìcias do sexo. Revejo as mesmas vitrines. Eu caminho em linha reta, quase confiante, porém, o que desejo mesmo é viver uma verdadeira vida e nâo apenas fingir uma existência pacata e feliz.

Eu percorro duas trilhas ao mesmo tempo. Pode parecer impossìvel para os outros. Para mim nâo ! È o mais natural possìvel. No começo senti-me meio deslocada, depois, monotonamente, todos os momentos foram se acumulando, camadas de areia em finas tranchas, sedimentos vulcânicos, formando um local seguro, impenetràvel e confortàvel. È verdade que no inìcio eu sentia dores horrìveis. A imagem que mais se aproxima deste meu instante é a mudança do couro da serpente. Desprendendo-se de mim, vagarosamente, quase ritual, tomando cada vez mais forma e importância na minha atual vida. Insconscientemente fui fabricando uma outra mulher dentro desta mulher que finjo viver. Uma mulher ousada. Aberta para as coisas do amor. Sensual no pensar e sem tanto temor dos abismos.

Nesta minha nova pele, algumas coisas que julgava impossìveis, em questâo de dias, tornaram-se acessìveis. A cada instante, que esta nova mulher crescia dentro da minha existência, sentia algumas portas se abrindo no meu secreto interior de mulher. Fica difìcil explicar. Como comunicar uma sensaçâo que està se formando. Uma sensaçâo ainda sem final. Algo que sentimos bulindo no nosso interior, mas nâo temos certeza do que seja realmente.

Até mesmo a traiçâo, o puro ato de trair, nâo deixa mais cicatrizes, nâo existe culpabilidades. Sinto-me forte, confiante, como se tivesse ganho uma medalha olìmpica. Acho que trair é como matar para um assassino profissional: a primeira vez dòi, corròi, tortura mesmo, depois a gente se acostuma e até mesmo o mais bàrbaro dos crimes, termina se transformando numa rotina. Numa coisa vulgar e simplòria que somos obrigados a fazer automaticamente todos os dias.

Atualmente eu me perco nestas duas vidas : uma fràgil e outra secreta. Cultivo hàbitos estranhos. Passei a beber chà todas as cinco horas. Pontualmente. Bestamente, como fazem as velhas inglesas : retiro um prazer sensual desta rotina meio ridìcula. Coisas que nunca imaginei, sem um aviso prévio, coloco em pràtica e fico deliciando-me com a minha ousadia.

Sinto-me como um trem fantasma que circula em duas linhas férreas ao mesmo tempo. Todas as linhas indicam o norte. Paralelas. Mesma direçâo. Paisagens diferentes. Eu sou este trem e olho pelas duas janelas : direita e esquerda. Dois lados. Duas paisagens diferentes. As duas paisagens simultâneas me agradam; elas existem, cada uma a sua maneira, nâo sou obrigado a escolher a melhor ou a mais bonita. Elas existem e isto me basta.

Tentei explicar a minha melhor amiga, sem entrar nos pormenores, se ela conseguiria viver assim : duas mulheres com gosto e similitudes antagônicas numa mesma mulher. Ela sorrir. Nâo comprende muito bem o significado das minhas palavras. Desisto. Gosto desta minha parte secreta, onde busco, quase inconsciente o delìrio de um dia. Sâo nestes poucos momentos que sinto-me verdadeira, repleta de algo que podemos catalocar de vida, nas outras vezes, sinto-me perdida, flàcida, como se tudo nâo tivesse verdadeiramente importância.
-Dia Internacional da Mulher
Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui